Cidadania Digital: Engajamento dos Cidadãos no Processo Digital

Renor A A Ribeiro, Ph.D. (2025)

A era digital tem transformado significativamente a maneira como os cidadãos no Brasil interagem com o governo e outras instituições, impactando os conceitos de Engajamento Cívico e Cidadania Digital.

A tecnologia emergiu como uma ferramenta poderosa que capacita os cidadãos a exercer uma cidadania ativa e a exigir prestação de contas dos processos. A participação cidadã ativa e a fiscalização do governo, assim como a promoção de mudanças em suas comunidades, são facilitadas pela tecnologia. A cidadania digital está transformando o cenário de prestação de contas e a forma como os cidadãos participam ativamente deste processo. A tecnologia otimiza todas as etapas, permitindo que organizações e a comunidade se unam em prol das políticas públicas.

A participação em plataformas tecnológicas, conhecida como e-participação, busca aumentar a contribuição e o engajamento do cidadão na construção de políticas públicas. Ela visa aproximar os cidadãos da gestão pública, aumentar a compreensão das limitações orçamentárias e encorajar as pessoas a participarem dos resultados do planejamento da cidade. O termo "e-participação" ou participação eletrônica é definido como a interação entre a sociedade e o ambiente político ou de gestão com o objetivo de ampliar a participação cidadã na tomada de decisões públicas. O conceito de e-participação envolve o uso de tecnologias para expandir a oferta de serviços públicos, aumentar a participação pública, melhorar os processos de deliberação e tomada de decisão na administração pública, incluir pessoas nas decisões e ampliar a deliberação política. O envolvimento do cidadão na tomada de decisão pública pode ser um poderoso sistema de coleta de informações e uma ferramenta para usar conhecimento e experiência local para definir prioridades políticas, alocar recursos de forma mais eficiente e aumentar a transparência na governança.

Uma tecnologia capaz de auxiliar na prestação de contas públicas é a plataforma Di.Acordo, que utiliza Big Data para agilizar processos sem desvios, garantir transparência e segurança no processamento de grandes volumes de dados, e gerar relatórios para análise e divulgação, combatendo a disseminação de notícias falsas. No contexto de cidades inteligentes, estudos investigaram os fatores que ampliam o engajamento na e-participação, como o caso da plataforma Fala Curitiba na Prefeitura Municipal de Curitiba. O estudo de caso da plataforma Fala Curitiba, reconhecida como uma inovação em Curitiba, a cidade mais inteligente do Brasil, busca ampliar o debate e a percepção da vontade popular nas propostas orçamentárias do município.

Os principais fatores que contribuem para o aumento da participação e engajamento do cidadão em processos de e-participação em uma cidade inteligente foram identificados como:

  • Informacionais: Acesso à informação, disseminação, recuperação e uso da informação.
  • Institucionais: Aproximação da gestão pública, interpretação dos resultados, lideranças, feedback, compreensão do processo, compromisso com a comunidade e inovação.
  • Motivacionais: Corresponsabilidade.
  • Tecnológicos: Inclusão digital e acesso a redes sociais. Estes fatores concentram as pessoas e a cidade na discussão e reconhecem a necessidade de ações de inclusão digital, como ampliar o uso de TICs, acesso à internet e capacitação tecnológica.
  • Culturais: Conduta e costumes, cidadania.

As redes sociais estão associadas à disseminação de informações, o que, por sua vez, amplia a participação. A inclusão digital e a aproximação da gestão pública também são causas da ampliação da participação, levando ao engajamento, assim como o feedback, o acesso à informação, a corresponsabilidade, a conduta e costumes, a compreensão do processo e as lideranças. Aqueles que mais se preocupam com os fatores tecnológicos e culturais são os cidadãos que participam das votações em plataformas eletrônicas.

Um estudo analisou as perspectivas de universitários brasileiros sobre a cidadania digital, revelando uma relação complexa entre inclusão digital, desigualdades sociais e acessibilidade. Os resultados destacam a necessidade de abordar não apenas o acesso à tecnologia, mas também as competências individuais e as oportunidades associadas ao seu uso.

A implementação de uma governança digital, informacional e participativa no Brasil tem sido um desafio, apesar do grande progresso na área. A Constituição de 1988 estabeleceu a base para a participação popular e a cultura da transparência pública. Diversas leis e políticas públicas foram criadas desde então, focando na transparência dos gastos, acesso à informação e governo eletrônico. Marcos relevantes incluem a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF), o "Portal da Transparência", a Lei de Acesso à Informação (LAI), a Política de Dados Abertos, o Código de Defesa do Usuário de Serviços Públicos (CDU), a Plataforma Cidadania Digital, a Política de Governança Digital (posteriormente revogada pela Estratégia de Governo Digital), o Sistema Nacional de Transformação Digital, e a Estratégia de Governo Digital 2020-2022. A LAI, por exemplo, tornou obrigatória a divulgação eletrônica de dados governamentais em sites oficiais, com componentes específicos como ferramentas de pesquisa e acesso automatizado de dados. A Estratégia de Governo Digital incluiu objetivos como o aumento da participação cidadã na elaboração de políticas públicas através de novas plataformas e a integração de portais de transparência, dados abertos e ouvidoria ao portal único gov.br. O portal único "gov.br" foi instituído para unificar canais digitais do governo federal, facilitando o acesso e reduzindo custos.

Apesar dos avanços legais e das iniciativas, a efetividade da transformação digital governamental ainda não é uma realidade plena. Barreiras culturais e estruturais, como a resistência institucional, traços de administração patrimonialista, falta de planejamento e coordenação, e a ausência de interesse e confiança dos cidadãos, dificultam um progresso mais profundo. A exclusão digital e a falta de capacidade de manejar equipamentos ou navegar sistemas também são obstáculos na sociedade civil.

Apesar dos desafios, o uso de tecnologias da informação e comunicação na administração pública tem o potencial de promover maior transparência governamental, previsibilidade das decisões públicas, segurança jurídica e expansão da participação e controle social dos cidadãos. A digitalização da gestão pública não apenas transporta funções para o ambiente virtual, mas transforma a atuação governamental, a formulação e prestação de serviços e as relações entre Estado e sociedade civil. Isso pode impulsionar a democracia e a governança pública digitais. As tecnologias participativas e interativas podem aprimorar a tomada de decisões e aumentar a produtividade, permitindo que a sociedade civil participe como colaboradora durante todo o processo decisório.

Contudo, um estudo sobre engajamento cívico e internet, com base em uma pesquisa no município de São Borja (RS), demonstrou que o ativismo político em redes sociais e outros meios digitais não implica necessariamente que uma pessoa esteja disposta a se engajar efetivamente em organizações da sociedade civil. Outra pesquisa sobre o uso da Internet por ONGs como alternativa para fomentar o engajamento cívico sinalizou que seu uso ainda é pouco profícuo para esse fim nas organizações estudadas. Além disso, uma meta-síntese sobre plataformas online de participação cidadã indicou que, embora haja um crescimento significativo dessas plataformas, seus impactos sociais e políticos são frequentemente mais retóricos do que práticos. A maioria das iniciativas governamentais tem pouca ou nenhuma influência no processo decisório real. A pesquisa sugere que o poder, e não a tecnologia, é o principal entrave para a efetiva participação cidadã online, com barreiras cultivadas por uma elite política tradicional pouco interessada em uma democracia transparente, inclusiva e colaborativa. As estruturas online não são inerentemente participativas; dependem diretamente do ambiente político e cultural em que estão inseridas.

Em conclusão, o panorama da cidadania digital e do engajamento cívico no Brasil, impulsionado pela tecnologia e pela implementação de governança digital, apresenta avanços notáveis no arcabouço legal e na disponibilização de plataformas. No entanto, ainda enfrenta desafios significativos relacionados a barreiras culturais, estruturais, à inclusão digital e à efetiva influência da participação online nos processos decisórios. A consolidação de uma governança verdadeiramente digital, transparente e participativa requer a superação desses obstáculos e um compromisso com a ampliação do poder decisório dos cidadãos.

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