O Papel das Parcerias Público-Privadas na Transformação Digital

 

Objetivos da Aula:

  • Compreender o Conceito e a Lógica das PPPs: Explicar o que são as Parcerias Público-Privadas, seus diferentes tipos e a fundamentação para sua adoção no setor público brasileiro.
  • Analisar como as PPPs Aceleram a Digitalização: Detalhar os mecanismos pelos quais essas parcerias impulsionam a transformação digital de serviços e a modernização do Estado.
  • Avaliar Vantagens, Riscos e Desafios: Apresentar uma análise crítica dos benefícios, bem como dos obstáculos e riscos inerentes a essas colaborações na era digital.
  • Identificar Casos de Sucesso e Modelos de Governança: Destacar exemplos concretos de PPPs voltadas para a inovação tecnológica (GovTechs, startups, Big Techs) e discutir as abordagens de governança e regulação.
  • Propor Aplicações Práticas e Recomendações: Fornecer insights sobre a aplicação eficaz das PPPs na jornada de digitalização do governo.

Introdução: A Era Digital e o Imperativo da Colaboração no Setor Público

A transformação digital é uma realidade que permeia todas as esferas da sociedade, impulsionando mudanças profundas na economia, na cultura e nas relações sociais. Nesse cenário, o setor público se vê diante do desafio e da oportunidade de modernizar seus processos e serviços, visando maior eficiência, transparência e proximidade com o cidadão. Para o Brasil, um país de dimensões continentais e complexidades intrínsecas, a capacidade de aproveitar o potencial das tecnologias digitais é crucial para o desenvolvimento.

Historicamente, o Estado brasileiro foi o principal provedor de bens e serviços públicos, especialmente na área de infraestrutura. No entanto, a crise dos anos 1980 e as subsequentes limitações orçamentárias levaram a reformas que culminaram na busca por novos modelos de financiamento e gestão, como as privatizações e, mais recentemente, as Parcerias Público-Privadas (PPPs). As PPPs surgem como um incentivo para o ingresso de capital privado no financiamento da infraestrutura e, hoje, desempenham um papel vital na aceleração da transformação digital no governo.

Esta aula aprofundará como as PPPs funcionam, seus impactos na digitalização dos serviços públicos e os elementos cruciais para seu sucesso, incluindo governança, gestão de riscos e o ambiente regulatório.


Desenvolvimento: PPPs como Vetores da Modernização Digital

1. O Conceito e a Lógica das Parcerias Público-Privadas (PPPs) no Setor Público

As Parcerias Público-Privadas (PPPs) são contratos de longo prazo, formalizados entre empresas privadas e a Administração Pública. Seu objeto pode envolver a prestação de serviços públicos ou serviços à própria Administração Pública, além da execução de obras e o fornecimento de bens. No Brasil, a Lei nº 11.079/2004 foi fundamental para estruturar esse modelo de parceria, visando garantir transparência e eficiência aos projetos.

A lógica por trás das PPPs reside na combinação da expertise técnica e agilidade do setor privado com os recursos e a capacidade de regulação do governo. O objetivo principal é garantir a entrega de serviços públicos de alta qualidade e complexidade, transferindo para o parceiro privado a responsabilidade por investimentos que o governo não teria condições de realizar sozinho. Isso tende a intensificar avanços tecnológicos e elevar a eficiência sistêmica.

Existem duas modalidades principais de PPP no Brasil:

  • Concessão Patrocinada: É um contrato similar à concessão comum de serviços públicos, mas com a adição de contraprestações pecuniárias regulares providas pela Administração Pública, além da receita tarifária. É utilizada para projetos cuja receita tarifária não seria suficiente para cobrir os custos e garantir o retorno do investimento do concessionário, tornando-os economicamente viáveis.
  • Concessão Administrativa: Esta modalidade envolve a prestação de serviços diretamente à Administração Pública, sem cobrança de tarifas dos usuários finais. A remuneração do parceiro privado provém integralmente da contraprestação pública e de receitas alternativas. Exemplos incluem serviços de iluminação pública ou manutenção de prédios públicos. Este modelo permite que projetos que tradicionalmente seriam contratados sob regime convencional (Lei 8.666/93) possam ser estruturados com a engenharia econômico-financeira das concessões, gerando maior eficiência pela conjugação de escopos diversos (ex: construção e operação de uma penitenciária).

As PPPs são contratos complexos, de longa duração (geralmente acima de 20 anos, visando amortizar investimentos) e com uma engenharia econômico-financeira diferenciada.

Perguntas para Reflexão:

  • Qual a principal diferença entre uma Concessão Patrocinada e uma Concessão Administrativa no contexto das PPPs?
  • De que forma as PPPs representam uma evolução em relação aos modelos de contratação pública anteriores no Brasil?

2. PPPs como Catalisadoras da Digitalização de Serviços

As PPPs atuam como aceleradoras da transformação digital no setor público por diversas razões, aproveitando as características do setor privado e a demanda crescente por serviços digitais.

  • Rapidez na Inovação: O setor privado possui maior agilidade para adotar novas tecnologias e métodos inovadores, o que se traduz em uma aceleração na implementação de soluções digitais no governo. Essa capacidade permite que o Estado acompanhe as tendências tecnológicas globais, otimizando a oferta de serviços digitais para a população.
  • União de Experiências e Melhores Práticas: As PPPs promovem a integração do conhecimento e das melhores práticas de ambos os setores. Essa sinergia resulta em soluções mais robustas e adaptadas às necessidades da administração pública, fomentando um ambiente de inovação contínua e adaptabilidade às mudanças. O movimento GovTech, que integra tecnologia e governo, é um exemplo claro desse alinhamento, com o desenvolvimento de soluções tecnológicas para aumentar a eficiência, transparência e acessibilidade dos serviços públicos.
  • Otimização de Custos e Eficiência Operacional: Um dos maiores benefícios da digitalização no governo, potencializado pelas PPPs, é a redução substancial de custos operacionais. O custo de atendimento online pode ser significativamente menor (chegando a 2,73% do custo do atendimento presencial em alguns benchmarks internacionais), gerando economias bilionárias para o governo e a sociedade. As PPPs permitem ao governo compartilhar os custos e riscos de projetos com o setor privado, o que aumenta as chances de que os projetos sejam entregues dentro do prazo e orçamento, minimizando desperdícios.
  • Melhoria da Qualidade e Acessibilidade dos Serviços: A busca por eficiência e resultados, característica do setor privado, estimula a criação de soluções que melhoram a qualidade dos serviços oferecidos ao cidadão, tornando-os mais acessíveis, rápidos e eficazes. A digitalização impulsionada por PPPs aumenta a eficiência operacional e a satisfação do usuário, fortalecendo a credibilidade e conexão do governo com a sociedade.

Perguntas para Reflexão:

  • Como a agilidade do setor privado se manifesta na aceleração da digitalização de serviços públicos via PPPs?
  • De que maneira a otimização de custos contribui para a atratividade das PPPs na transformação digital?

3. Análise Abrangente: Vantagens, Riscos e Desafios

Apesar dos benefícios, as PPPs, especialmente aquelas voltadas para a transformação digital, enfrentam um conjunto de vantagens, riscos e desafios que precisam ser cuidadosamente gerenciados.

Quadro Conceitual: Vantagens, Riscos e Desafios das PPPs na Transformação Digital

 

Categoria

Aspectos

Detalhamento com base nas fontes

Vantagens

Atração de Capital Privado

Possibilitam o financiamento de atividades econômicas e infraestrutura que o Estado não conseguiria realizar sozinho.

Eficiência e Produtividade

A transferência de responsabilidades e a flexibilidade da gestão privada tendem a elevar a produtividade e a eficiência dos serviços.

Transferência de Riscos

A alocação objetiva dos riscos ao parceiro mais apto a gerenciá-los (privado) é um princípio central, embora a mitigação pelo público ocorra.

Inovação Tecnológica

O setor privado introduz novas tecnologias e métodos mais rapidamente, acelerando a implementação de soluções digitais. O movimento GovTech se beneficia disso.

Melhoria na Qualidade dos Serviços

A competição entre empresas privadas e a busca por resultados elevam os padrões de eficiência e qualidade dos serviços públicos digitais.

Economia para o Estado e Cidadão

A digitalização de serviços via PPPs gera economias substanciais para o poder público e para a sociedade, reduzindo o custo de atendimento.

Riscos e Desafios (Gerais)

Complexidade Contratual e Alocação de Riscos

Os contratos devem ter definição expressiva dos riscos e responsabilidades, mas há evidências de que o parceiro privado absorve a maioria formalmente, com medidas de mitigação pelo público. A imprecisão contratual pode gerar litígios.

Custos de Financiamento

Projetos de infraestrutura têm longo prazo de maturação e custos elevados na fase preparatória, o que pode aumentar os custos de financiamento.

Capacidade Institucional Pública

A Administração Pública precisa de capacidade técnica e institucional para analisar estudos e propostas, minimizando o risco de captura do interesse público.

Requisitos Legais e Fiscais

A implementação exige um quadro legislativo e normativo local adequado, além de atendimento a exigências fiscais e orçamentárias de longo prazo.

Risco de Inadimplemento Público

A falta de cumprimento das obrigações pecuniárias pelo parceiro público é um risco que demanda garantias eficazes para atrair investidores.

Riscos e Desafios (Digitais)

Proteção de Dados e Privacidade

O uso de ferramentas que coletam informações sensíveis (ex: câmeras de reconhecimento facial) impõe o desafio de legislações que resguardem a privacidade. É necessária uma lei específica de proteção de dados pessoais.

Velocidade Legislativa vs. Tecnológica

A evolução tecnológica é mais rápida que a criação de leis, gerando um gap regulatório.

Concentração de Poder

Plataformas digitais, com seus "efeitos de rede" e "vantagem do primeiro a chegar", podem gerar riscos de concentração de poder econômico que exigem monitoramento e regulação.

Reconhecimento Legal de Novas Tecnologias

Tecnologias como blockchain têm grande potencial, mas o certificado digital ainda é a única com validade jurídica no Brasil.

Burocracia e Contratação de Startups

As regras mais rígidas da Administração Pública (experiência prévia, sustentabilidade financeira) contrastam com a operação de startups, dificultando a contratação de soluções inovadoras.

Perguntas para Reflexão:

  • Como a Lei nº 11.079/2004 busca equilibrar a transferência de riscos para o setor privado com a proteção do interesse público?
  • Quais os principais desafios éticos e regulatórios que as PPPs enfrentam ao digitalizar serviços que coletam dados sensíveis da população?

4. Modelos de Governança, Contratos e Regulamentação na Era Digital

A eficácia das PPPs na transformação digital depende de uma governança robusta, contratos bem estruturados e um ambiente regulatório adaptável.

  • Capacidade Institucional e Planejamento: É fundamental que a Administração Pública esteja tecnicamente e institucionalmente capacitada para a estruturação e gestão das PPPs. Isso inclui a criação de um Conselho Gestor do Programa de PPP (CGP) e um Comitê Técnico (CT) para análises e decisões.
  • Procedimento de Manifestação de Interesse (PMI): Um mecanismo crucial para a estruturação de PPPs, o PMI permite que a Administração Pública obtenha estudos, projetos e levantamentos da iniciativa privada. Esses estudos podem ser solicitados publicamente ou partir de propostas não solicitadas. O autor do projeto do PMI pode, em geral, participar da licitação subsequente, sendo ressarcido por seus estudos.
  • Sociedade de Propósito Específico (SPE): A lei exige que o licitante vencedor constitua uma SPE exclusivamente para a PPP. Isso segrega os riscos do projeto dos demais negócios do grupo, melhora a governança e facilita o controle fiscalizatório do poder concedente, além de otimizar as condições de financiamento.
  • Alocação Objetiva de Riscos: Os contratos de PPP devem identificar e alocar os riscos de forma objetiva. Isso é crucial para a equação econômico-financeira do contrato e minimiza litígios.
  • Remuneração por Desempenho: As PPPs enfatizam obrigações de desempenho, focadas no alcance de resultados (outputs), e não apenas nos meios. A remuneração do concessionário é atrelada a esses padrões de qualidade e quantidade, incentivando a eficiência.
  • Medidas de Mitigação de Riscos: Os contratos preveem diversas cláusulas para mitigar riscos, como mecanismos de reequilíbrio econômico-financeiro (em caso de alterações legais ou tributárias, intervenção do setor público, ou mudanças de design ex post), compartilhamento de riscos com seguros, e ajustes periódicos das receitas por índice de inflação. A transferência de riscos para os financiadores (step-in right) permite que a instituição financiadora assuma o controle da SPE em caso de inadimplemento.
  • Garantias Públicas: São essenciais para acautelar o parceiro privado contra o risco de inadimplemento público, tornando a PPP factível e reduzindo os custos de financiamento. Podem incluir fundos garantidores ou outras modalidades.
  • Regulamentação e Novas Tecnologias: O ambiente digital exige atualização normativa constante. A aprovação de lei específica de proteção de dados pessoais e a criação de uma autoridade nacional são cruciais para a confiança no ambiente digital. É preciso estimular a adoção de padrões internacionais como "privacy by design and default" e "security by design and default". Modelos como "regulatory sandboxes" (ambientes regulatórios flexíveis) podem ser desenvolvidos para testar novos modelos de negócios inovadores. O Brasil também busca uma política nacional de segurança cibernética e planos de prevenção, resposta e mitigação de ameaças, especialmente para infraestruturas críticas.

Perguntas para Reflexão:

  • De que forma a figura da Sociedade de Propósito Específico (SPE) contribui para a segurança jurídica e financeira de uma PPP?
  • Qual o papel das "regulatory sandboxes" no estímulo à inovação digital dentro do setor público?

Casos Reais de PPPs Digitais (Brasil e Mundo)

A transformação digital via PPPs já apresenta casos de sucesso e iniciativas promissoras no Brasil e internacionalmente, demonstrando seu potencial em diversas áreas.

  • Carteira de Identidade Nacional (CIN): No Brasil, a emissão da nova Carteira de Identidade Nacional (CIN) é um exemplo notável de PPPs impulsionando a identidade digital. A empresa Valid, em parceria com a Polícia Civil de 23 Estados e o Distrito Federal, emitiu mais de 8 milhões de CINs em um ano. Este documento é considerado o mais seguro da América Latina e facilita o acesso da população a serviços e a inclusão financeira.
  • Digitalização do DETRAN Ceará e Integração da Pefoce: Outro caso de sucesso é a parceria entre a Valid e o DETRAN do Ceará. Inicialmente focada em manter serviços essenciais durante a pandemia (com um Chatbot), a colaboração se expandiu para a criação de um Balcão Digital para serviços como segunda via da CNH e licenciamento de veículos. Em 2024, a Pefoce (Polícia Forense do Estado do Ceará) está se integrando ao projeto para fortalecer uma plataforma interoperável de troca de dados entre secretarias e órgãos do Estado, exemplificando a união de expertises diferentes.
  • Cidades Inteligentes (Smart Cities): As PPPs são apontadas como capazes de moldar o futuro das cidades inteligentes, utilizando tecnologias como Internet das Coisas (IoT), Inteligência Artificial (IA) e Big Data para otimizar a gestão e operação de serviços urbanos. Empresas de tecnologia podem auxiliar governos na transformação digital eficiente e em conformidade com aspectos legais de privacidade e segurança de dados. O programa Cidades Inteligentes, do MCTIC, visa implantar infraestrutura de rede de fibra óptica urbana para conectar órgãos públicos, oferecer acesso à internet e estimular parcerias público-privadas.
  • Transformação Digital do Governo em Geral: A Estratégia de Governança Digital (EGD), instituída pelo Decreto nº 8.638 em 2016, visa desburocratizar e modernizar a relação do Estado com a sociedade usando tecnologias digitais. Ela busca expandir e inovar a prestação de serviços digitais, promover a disponibilização de dados abertos e garantir a segurança da informação. Iniciativas como o GovData (plataforma de análise de dados governamentais) e o ConectaGov (interoperabilidade) e Predic (reconhecimento digital do cidadão) são exemplos de como o governo federal busca aprimorar o uso de dados e a prestação de serviços.
  • Infraestrutura de Conectividade: Projetos como o Amazônia Conectada, que implanta uma rede de cabos subfluviais para prover infraestrutura de telecomunicações em regiões remotas do Norte do Brasil, são cruciais. A expansão das redes de banda larga, com participação de operadoras de telecomunicações e incentivos estaduais para instalação de antenas 3G/4G, é fundamental para a inclusão digital.
  • Apoio a Startups e Inovação: Programas governamentais como Startup Brasil, InovAtiva Brasil e Conexão Startup Indústria apoiam empresas nascentes de base tecnológica. Há um desafio de aumentar a oferta de capital de risco e facilitar a contratação de startups pelo Estado. O Núcleo de IA do Governo Federal, implementado pelo MGI, busca impulsionar a adoção e desenvolvimento de Inteligência Artificial no governo federal, com foco em saúde e educação, em parceria com o setor privado.

Representações Visuais e Fluxo da PPP (Conceitual)

Embora não seja possível gerar imagens aqui, podemos descrever as representações visuais fundamentais para entender as PPPs e sua relação com a transformação digital.

1. Fluxo de uma Parceria Público-Privada (Conceitual, inspirada em)

Uma PPP, em sua essência, pode ser visualizada como um processo em duas grandes fases:

  • Fase de Preparação (ou Fase de Investimentos):
    • Início: Ocorre a decisão administrativa de iniciar um programa de PPP, muitas vezes precedida por um Procedimento de Manifestação de Interesse (PMI) para obter estudos e projetos da iniciativa privada.
    • Estruturação: Elaboração de estudos jurídicos, operacionais, de engenharia (anteprojeto), de demanda, financeiros e ambientais. Definição da Matriz de Riscos, que aloca responsabilidades entre público e privado.
    • Autorização e Garantias: Formalização das autorizações e justificativas fiscais e orçamentárias. Estruturação das garantias públicas (ex: fundo garantidor) para mitigar o risco de inadimplemento do parceiro público.
    • Licitação: Publicação do edital, realização de consulta e audiência pública (se exigível), e o processo de licitação propriamente dito. O licitante vencedor constitui uma Sociedade de Propósito Específico (SPE).
    • Execução da Infraestrutura: O parceiro privado obtém financiamentos, realiza os investimentos e executa as obras e aquisição de bens necessários para colocar o serviço em funcionamento. Durante esta fase, não há contraprestação pública regular, exceto por aportes públicos específicos para construção ou aquisição de bens reversíveis.
  • Fase de Operação (ou Fase de Prestação de Serviços):
  • Disponibilização do Serviço: Inicia-se quando o serviço ou parte dele está em condições de ser prestado.
  • Remuneração: A receita da PPP se concretiza, vinda da tarifa (concessão patrocinada) e/ou da contraprestação pública (concessão administrativa), além de receitas alternativas. A remuneração é atrelada a indicadores de desempenho.
  • Manutenção e Gestão: O concessionário é responsável pela gestão e manutenção do empreendimento ao longo do período contratual.
  • Amortização: Os investimentos realizados na fase preparatória são amortizados ao longo desta fase.
  • Mitigação Contínua: Mecanismos como o reequilíbrio econômico-financeiro podem ser acionados para ajustar o contrato diante de eventos imprevistos.

2. Matriz de Fatores de Risco (Inspirada em e)

A matriz de risco em contratos de PPPs é um elemento fundamental que identifica os riscos e os aloca à responsabilidade de cada parte (público, privado ou partilhado). O gráfico de fatores de risco da fonte ilustra categorias amplas, como:

  • Riscos Políticos: Incluem risco país/soberano, nacionalização de ativos, e risco legal. O risco legal, por exemplo, é 100% de responsabilidade do ente público em 100% dos contratos avaliados.
  • Riscos de Construção: Abrangem atrasos na construção, alterações de design ex post, e falhas na construção. Alterações de design ex post são alocadas em 87% dos contratos ao setor público.
  • Riscos Operacionais: Relacionados à qualidade do serviço, obsolescência técnica ou inovação.
  • Riscos Financeiros/Macroeconômicos: Incluem alteração cambial, alteração de juros, tributário, moratória, indisponibilidade de financiamento, e inflação. O risco de alteração de custos inicialmente previstos é 100% alocado ao parceiro privado, enquanto o risco de alteração tributária é 93% alocado ao setor público. O risco de inflação é mitigado em 100% dos projetos por cláusulas de reajuste anual.
  • Riscos Comerciais: Principalmente o risco de demanda. Em 53% dos contratos, este risco é partilhado entre público e privado, com gatilhos para reequilíbrio.
  • Risco de Força Maior: Desastres naturais, calamidades, etc.. Em 93% dos contratos, este risco é partilhado com base na natureza do evento e capacidade de absorção.

Perguntas Reflexivas

  • Considerando a dinâmica de evolução tecnológica, como as PPPs podem garantir que os serviços digitais entregues permaneçam relevantes e atualizados ao longo do tempo de contrato?
  • Quais seriam os desafios na avaliação e mitigação de riscos em projetos de PPPs digitais que envolvem tecnologias emergentes como Inteligência Artificial ou computação quântica?
  • De que forma a transparência e o controle social podem ser aprimorados nas PPPs digitais para garantir o uso ético dos dados do cidadão?

Aplicação Prática e Recomendações

Para maximizar os benefícios das PPPs na transformação digital e superar os desafios, algumas recomendações e aplicações práticas são cruciais:

  • Fortalecimento da Governança e Capacitação: É essencial que o governo invista na capacitação de seus quadros para lidar com a complexidade das PPPs e das tecnologias digitais. A criação e o fortalecimento de conselhos e comitês técnicos especializados são fundamentais para uma análise aprofundada dos projetos.
  • Desenvolvimento de Marcos Regulatórios Flexíveis: A velocidade da transformação digital exige que a legislação e a regulação sejam mais ágeis e adaptáveis. A criação de "regulatory sandboxes" (ambientes regulatórios flexíveis para testes de modelos de negócios inovadores) é uma ferramenta importante para isso. A aprovação de uma lei de proteção de dados pessoais e a regulamentação do uso da Inteligência Artificial (como o Projeto de Lei 2.338/2023) são passos essenciais para conferir segurança jurídica e confiança.
  • Estímulo à Interação e ao Ecossistema Digital: Promover o diálogo permanente entre governo, academia, setor privado (incluindo startups e Big Techs) é vital para identificar prioridades, alinhar políticas e fomentar o desenvolvimento de soluções digitais. O poder de compra público pode ser utilizado para estimular a PD&I e a contratação de startups, mesmo com suas particularidades.
  • Padronização e Interoperabilidade: Incentivar a definição e adoção de padrões e certificações de "privacy by design and default" e "security by design and default" é crucial para garantir a segurança e a interoperabilidade dos sistemas digitais. A integração de bases de dados governamentais e a disponibilização de dados abertos (como via dados.gov.br) são essenciais para criar valor econômico e social, permitindo o surgimento de novos negócios e serviços públicos mais eficientes.
  • Foco na Inclusão Digital e Letramento: As PPPs devem priorizar a ampliação do acesso à internet em áreas remotas e escolas, e o desenvolvimento de habilidades e capacidades digitais na população. Isso garante que a digitalização beneficie a todos, combatendo a lacuna digital que afeta grande parte da população brasileira.
  • Internacionalização: Buscar a inserção das empresas brasileiras em mercados globais e atuar nos fóruns internacionais para influenciar a governança e as regras da economia digital, garantindo um ambiente mais equitativo para o comércio eletrônico e o fluxo de dados.

Em suma, as Parcerias Público-Privadas são ferramentas poderosas para a transformação digital do Estado brasileiro. No entanto, seu sucesso depende de um planejamento estratégico robusto, de uma gestão de riscos eficaz e de um ambiente regulatório que consiga acompanhar a velocidade das inovações tecnológicas, sempre com foco na geração de valor público e na melhoria da vida do cidadão.


Referências

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BRASIL. Ministério das Comunicações. Ministério das Comunicações destaca importância das parcerias público-privadas para promover inclusão digital. Portal Gov.br, 17 nov. 2024. Disponível em: https://www.gov.br/mcom/pt-br/noticias/2024/11/ministerio-das-comunicacoes-destaca-importancia-das-parcerias-publico-privadas-para-promover-inclusao-digital. Acesso em: 15 mai. 2024.

BRASIL. Ministério da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos. No G20, Gestão debate parcerias público-privadas para impulsionar a transformação digital. Gov.br, 18 nov. 2024. Disponível em: https://www.gov.br/gestao/pt-br/noticias/2024/novembro/no-g20-gestao-debate-parcerias-publico-privadas-para-impulsionar-a-transformacao-digital. Acesso em: 15 mai. 2024.

VALID. O que são Parcerias Público Privadas e como elas potencializam os benefícios do Governo Digital no Brasil. Valid, 14 mar. 2025. Disponível em: https://valid.com/blog/o-que-sao-parcerias-publico-privadas-e-como-elas-potencializam-os-beneficios-do-governo-digital-no-brasil/. Acesso em: 15 mai. 2024.

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CÂMARA BRASILEIRA DA INDÚSTRIA DA CONSTRUÇÃO (CBIC). Concessões e parcerias público-privadas: guia para o gestor público. Brasília: CBIC, 2016.