Órgãos de controle, TCU e CGU, avaliação da execução orçamentária
Fiscalização do TCU nas Receitas Previdenciárias (Relatório TCU 888/2024)

A arrecadação de contribuições previdenciárias para o Regime Geral de Previdência Social (RGPS) enfrenta diversos desafios significativos que impactam diretamente o equilíbrio financeiro e atuarial do fundo. Uma auditoria operacional recente avaliou a eficiência e eficácia da arrecadação de contribuições previdenciárias do RGPS no período de janeiro de 2017 a dezembro de 2021, identificando oportunidades de melhoria e diversas inconsistências.
Os principais desafios e seus impactos no RGPS são:
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Elevado estoque de créditos previdenciários em atraso e baixa recuperação de créditos:
- Desafio: O estoque de créditos previdenciários em atraso, que são valores devidos mas não recolhidos por contribuintes, atingiu R$ 939 bilhões em dezembro de 2021, o equivalente a cerca de 186% da receita previdenciária arrecadada no mesmo ano. Este percentual é significativamente superior ao parâmetro de 20% considerado uma boa prática internacional pela ferramenta Tadat. A maioria desses créditos é antiga, com pelo menos 76% do estoque em dezembro de 2020 com atraso superior a doze meses. Além disso, 43% do estoque total (R$ 403 bilhões) em dezembro de 2021 era classificado como de baixa perspectiva de recuperação (rating "C") ou irrecuperável (rating "D").
- Causas: As causas incluem o baixo índice de recuperação desses créditos, com menos de 6% dos valores lançados em 2017 recuperados até 2021, e apenas R$ 11 bilhões recuperados em 2021, o que é insuficiente para neutralizar os novos lançamentos de R$ 20,5 bilhões no mesmo ano. A morosidade na resolução de litígios fiscais também contribui, com tempos médios de julgamento administrativo de 1ª instância (DRJ) de 784 dias (2,1 anos) e de 2ª instância (Carf) de até 1.192 dias (3,3 anos) na Câmara Superior de Recursos Fiscais, totalizando 6,6 anos em média na esfera administrativa. Há também uma elevada proporção de créditos em litígio, que cresceu 15% nos últimos cinco anos, alcançando R$ 807 bilhões em 2021 (86% do total). A frequente concessão de parcelamentos especiais, com cerca de 40 programas em dezoito anos que oferecem reduções de multas e prazos longos, incentiva a inadimplência, pois cerca de 50% dos aderentes tornam-se inadimplentes novamente. A complexidade da legislação previdenciária, com múltiplas regras e regimes especiais, aumenta a possibilidade de interpretações divergentes e dificulta o cumprimento voluntário.
- Impactos no RGPS: Acumula receitas de contribuições previdenciárias que deveriam ter ingressado nos cofres do Fundo do Regime Geral de Previdência Social (FRGPS), prejudicando o equilíbrio financeiro e atuarial do RGPS. O estoque de 2021 era suficiente para cobrir o déficit previdenciário por cerca de três anos e meio. A perda desses valores tem um impacto financeiro para o Tesouro Nacional, devido à obrigação legal da União de complementar os recursos do FRGPS.
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Irregularidades nas remessas de dados de arrecadação por agentes arrecadadores:
- Desafio: Foi constatada uma quantidade significativa de remessas de dados da arrecadação diária com irregularidades enviadas pelos agentes arrecadadores. Entre janeiro de 2017 e agosto de 2020, 9,29% das remessas apresentaram ao menos uma irregularidade. As irregularidades mais frequentes são a transcrição incorreta de dados em documentos de arrecadação (DARF) e o atraso na entrega de remessas de dados, que representam 77,4% do total. Bancos como Caixa Econômica Federal (27,69%), Bradesco (10,31%) e Santander (10,20%) foram os que apresentaram os maiores percentuais de remessas com irregularidades no período de 2017 a 2020. A Caixa Econômica Federal manteve um percentual mensal de irregularidades sempre acima de 5%.
- Impactos no RGPS: Gera uma sobrecarga para a equipe de controle da rede arrecadadora (EQARF), composta por apenas cinco servidores, que precisa realizar comunicações e intimações manuais. A transcrição incorreta de dados pode, em última análise, resultar na utilização indevida de receitas previdenciárias para despesas distintas do pagamento de benefícios do RGPS, violando o artigo 167, inciso XI, da Constituição Federal.
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Ausência de acompanhamento e avaliação separados do desempenho da arrecadação previdenciária:
- Desafio: A Receita Federal do Brasil (RFB) não possui instrumentos específicos para acompanhar e avaliar o desempenho da arrecadação, o cumprimento das obrigações acessórias pelos contribuintes e a recuperação de créditos a receber na área previdenciária de forma separada. As avaliações e indicadores utilizados pela RFB são agregados, abrangendo todas as receitas que o órgão administra.
- Causas: A principal causa é a característica do trabalho da RFB, onde indicadores e metas são definidos e mensurados de forma agregada para todos os tributos.
- Impactos no RGPS: Dificulta a gestão pormenorizada da receita previdenciária e a identificação de áreas específicas que necessitam de melhorias. Impede a definição de políticas públicas mais eficazes, eventuais alterações legislativas e a melhoria de processos de trabalho relativos à arrecadação de contribuições previdenciárias. Compromete o cumprimento do requisito legal de avaliar as atividades relativas à tributação das contribuições previdenciárias e o princípio da eficiência.
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Ausência de estimativas do gap tributário para contribuições previdenciárias:
- Desafio: A RFB não realiza estudos ou utiliza metodologias para estimar o gap tributário (ou brecha de cumprimento tributário), que é a diferença entre a arrecadação efetiva e a potencial, para as contribuições previdenciárias. Embora uma metodologia esteja sendo implementada para outros tributos (PIS/Cofins), ainda não foram iniciadas providências para as contribuições previdenciárias.
- Causas: Ausência de implementação de metodologia para a realização de estudos sobre o gap de cumprimento tributário baseados em boas práticas internacionais.
- Impactos no RGPS: Prejudica a qualidade e precisão do monitoramento das perdas de receitas previdenciárias decorrentes de informações incorretas prestadas pelos contribuintes. Dificulta a adoção tempestiva de medidas eficazes para garantir o cumprimento tributário, o acompanhamento e avaliação da arrecadação previdenciária, e a aferição da efetividade da arrecadação. Impede a transparência sobre os níveis de inadimplência e evasão fiscal. Leva a decisões intempestivas e não fundamentadas na gestão desses tributos.
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Ausência de integração entre os sistemas de classificação contábil (Clacon e Arpa):
- Desafio: Os sistemas de classificação contábil das receitas previdenciárias, Clacon e Arpa, não são integrados, apesar de terem objetivos semelhantes. O sistema Arpa é específico para receitas previdenciárias arrecadadas via GPS, enquanto o Clacon classifica receitas arrecadadas via DARF, DAS, DAE e DJE, que agora compõem a maior parte da arrecadação previdenciária.
- Causas: A diferença se deve à origem do Arpa, que é um sistema antigo da extinta Secretaria da Receita Previdenciária, enquanto o Clacon foi desenvolvido para classificar os tributos administrados pela RFB.
- Impactos no RGPS: Afeta a eficiência na classificação contábil das receitas previdenciárias, exigindo a operação de dois sistemas para atividades semelhantes. Isso demanda treinamentos adicionais para servidores e gera tratativas com dois fornecedores distintos de tecnologia da informação (Dataprev e Serpro). Cria dificuldades na padronização de operações e controles e aumenta a possibilidade de erros.
Em suma, a auditoria do TCU revelou que, embora a RFB realize ações para identificar e reduzir o descumprimento das obrigações tributárias previdenciárias, há oportunidades críticas de melhoria na recuperação de créditos, na gestão de irregularidades de arrecadação, e na criação de instrumentos específicos para acompanhamento e avaliação do desempenho da arrecadação previdenciária e do gap tributário. A implementação dessas melhorias é essencial para promover o equilíbrio financeiro e atuarial do RGPS e reduzir o impacto financeiro para o Tesouro Nacional.
Referência
BRASIL. Tribunal de Contas da União. Plenário. Acórdão n. 888/2024, de 8 de maio de 2024. Relator: Ministro Aroldo Cedraz. Processo TC 042.934/2021-4. Auditoria de natureza operacional. Arrecadação de contribuições previdenciárias vinculadas ao Fundo do Regime Geral de Previdência Social (FRGPS). Identificação de oportunidades de melhoria. Necessidade de monitoramento do grau de prestação de informações incorretas pelos contribuintes de contribuições previdenciárias. Falta de adoção de instrumentos que permitam acompanhamento e avaliação do desempenho para as contribuições previdenciárias do RGPS separadamente. Recomendações. Comunicações. Disponível em:
Quais são os principais desafios na arrecadação de contribuições previdenciárias e seus impactos no RGPS?
Tópico: Órgãos de controle, TCU e CGU, avaliação da execução orçamentária
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