Programa de Integridade e Compliance nas contratações - Parte 1
Apresentação
Sejam bem-vindos à primeira parte da aula sobre "Programa de Integridade e Compliance nas Contratações Públicas". Nesta aula de 5 horas, exploraremos os fundamentos e a estrutura essencial dos programas de integridade e compliance, com foco nas particularidades do setor público brasileiro. Aprofundaremos as definições, o marco legal que rege o tema, os objetivos essenciais e os elementos estruturais que compõem um programa efetivo. Além disso, traremos exemplos práticos e perguntas reflexivas para enriquecer o aprendizado.
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Módulo 1: Introdução aos Programas de Integridade e Compliance
1.1. Definição de Integridade e Compliance
O termo "compliance" tem origem no verbo em inglês to comply, que significa "cumprir". No âmbito institucional e empresarial, compliance refere-se ao conjunto de disciplinas que visam cumprir e fazer cumprir as normas legais e regulamentares, as políticas e as diretrizes estabelecidas para o negócio e para as atividades da instituição ou empresa. Ele busca evitar, detectar e tratar quaisquer desvios ou inconformidades que possam ocorrer.
Um Programa de Integridade, por sua vez, é um conjunto de mecanismos e procedimentos internos de integridade, auditoria e incentivo à denúncia de irregularidades, além da aplicação efetiva de códigos de ética e de conduta, políticas e diretrizes. Seus objetivos são prevenir, detectar e sanar desvios, fraudes, irregularidades e atos ilícitos praticados contra a administração pública, nacional ou estrangeira, e fomentar e manter uma cultura de integridade no ambiente organizacional.
Recentemente, o conceito de Programa de Integridade tem se expandido para incluir não apenas o combate à fraude e à corrupção, mas também a prevenção e remediação de outros desvios éticos e de conduta, violação ou desrespeito a direitos, valores e princípios que impactam a confiança, a credibilidade e a reputação institucional. Isso abrange questões como prevenção do assédio, respeito aos direitos humanos e sociais e a preservação do meio ambiente, alinhando-se à temática ASG (Ambiental, Social e Governança).
1.2. Diferenciação do Compliance no Setor Público e Privado
Embora a essência de "cumprir regras" seja comum, o foco e as nuances do compliance e da integridade diferem entre os setores público e privado:
• Setor Privado: O compliance em empresas privadas, como o compliance trabalhista, dedica-se a criar e manter programas de integridade para orientar condutas e políticas que mitiguem riscos e prejuízos, e evitem a responsabilização por condutas ilegais. Isso se dá por meio da adequação e respeito às leis, acordos e convenções coletivas de trabalho. Abrange aspectos como contratos de trabalho, segurança no trabalho, contratação de terceirizados, cultura corporativa, jornada de trabalho e impactos ambientais. A estruturação dessas medidas visa a preservação dos valores da empresa, da sua cultura, e da sua imagem perante o mercado, transmitindo credibilidade e transparência. A integração de critérios ASG (Ambiental, Social e Governança) também ganhou destaque significativo no setor empresarial, sendo crucial para investimentos e contratação de parceiros.
• Setor Público: No contexto das contratações públicas, o Programa de Integridade visa a promoção da integridade corporativa em contratos com a Administração Pública. O foco principal é a proteção do patrimônio público nacional ou estrangeiro, a observância dos princípios da administração pública e o cumprimento dos compromissos internacionais assumidos pelo Brasil. A demanda por uma atuação responsável, comprometida com o desenvolvimento econômico-social sustentável, justo e democrático é cada vez mais atual da sociedade. As leis específicas no setor público, como a Nova Lei de Licitações (Lei nº 14.133/2021) e a Lei Anticorrupção (Lei nº 12.846/2013), estabelecem exigências e consequências diretas para a falta de integridade nas relações com o Estado.
Pergunta Reflexiva: "Como a cultura organizacional e os objetivos de lucro no setor privado podem influenciar a forma como a integridade é percebida e implementada, em comparação com o foco no interesse público no setor governamental?"
1.3. Objetivos de um Programa de Integridade
Os programas de integridade têm múltiplos objetivos, que vão além da mera conformidade legal:
• Prevenção: O objetivo primordial é prevenir a ocorrência de desvios, fraudes, irregularidades e atos ilícitos contra a administração pública. Isso se alcança por meio da criação de um ambiente robusto de controle e orientação de condutas.
• Detecção: Caso a prevenção falhe, o programa deve ser capaz de detectar as irregularidades o mais rápido possível. Ferramentas como canais de denúncia e controles internos são cruciais para isso.
• Remediação: Uma vez detectada a irregularidade, o programa deve prever mecanismos para sanar os desvios, ou seja, corrigi-los e mitigar seus impactos. Isso inclui investigações internas, aplicação de sanções e reparação de danos.
• Fomento à Cultura de Integridade: Mais do que apenas evitar o ilícito, um programa eficaz busca fomentar e manter uma cultura de integridade no ambiente organizacional. Isso significa que os valores éticos devem ser compartilhados por todos os membros da organização.
• Transparência e Governança: O programa de integridade atua como um aliado da boa governança, promovendo a transparência e influenciando positivamente a tomada de decisões. Ele contribui para a valorização da imagem e reputação da empresa, transmitindo confiança e credibilidade.
• Promoção de Ética e Responsabilidade Social: Em sua visão mais ampla, o programa busca promover a ética, a boa governança, o respeito aos direitos humanos e sociais, e a preservação do meio ambiente, contribuindo para o desenvolvimento sustentável da empresa e da sociedade.
Os benefícios de um Programa de Integridade bem implementado incluem o ganho de imagem e reputação, o aumento de oportunidades comerciais, a redução de custos operacionais e da possibilidade de fraudes internas, a atração e retenção de funcionários que prezam pela ética, e a menor probabilidade de ocorrência de fraude e corrupção, além da redução do impacto de tais eventos, incluindo a possibilidade de diminuição do valor de multas.
1.4. Contexto Histórico e Evolução do Compliance no Brasil
A ideia de programas de compliance tem suas origens nos Estados Unidos, remontando à virada do século XX com a criação de agências reguladoras como o FDA (Food and Drug Act, 1906) e o Federal Reserve System (1913), que visavam a estabilidade e segurança do sistema financeiro. Um marco importante foi o FCPA (Foreign Corrupt Practices Act) de 1977, a lei anticorrupção transnacional norte-americana, que exigia que as empresas mantivessem livros e registros precisos e estabelecessem sistemas de controles internos adequados.
No Brasil, o conceito de compliance ganhou força a partir da Lei nº 12.846/2013, conhecida como Lei Anticorrupção. Esta lei ampliou os conceitos relacionados a programas de compliance no país, introduzindo a responsabilização objetiva de pessoas jurídicas por atos lesivos contra a administração pública.
A evolução continuou com o Decreto nº 8.420/2015, que regulamentou a Lei Anticorrupção e trouxe a primeira definição de Programa de Integridade na legislação brasileira. Posteriormente, este foi revogado pelo Decreto nº 11.129/2022, que atualizou a regulamentação da Lei Anticorrupção, trazendo uma nova e mais ampla definição de Programa de Integridade, com foco na cultura organizacional.
A Lei nº 14.133/2021 (Nova Lei de Licitações e Contratos Administrativos) consolidou ainda mais a importância dos programas de integridade, tornando-os obrigatórios em determinadas contratações públicas e estabelecendo seu papel em diversos momentos do processo licitatório e contratual.
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Módulo 2: O Marco Legal dos Programas de Integridade nas Contratações Públicas
Este módulo detalha os principais instrumentos legais que fundamentam e regulam os programas de integridade no Brasil, especialmente no contexto das contratações públicas.
2.1. Lei nº 12.846, de 1º de Agosto de 2013 (Lei Anticorrupção Brasileira)
A Lei Anticorrupção (ou Lei da Empresa Limpa) foi um marco fundamental para o compliance no Brasil. Ela dispõe sobre a responsabilização objetiva administrativa e civil de pessoas jurídicas pela prática de atos contra a administração pública, nacional ou estrangeira. A responsabilização da pessoa jurídica ocorre independentemente da responsabilização individual de seus dirigentes ou administradores, que serão responsabilizados na medida da sua culpabilidade.
• Responsabilização Objetiva: As pessoas jurídicas são responsabilizadas objetivamente (ou seja, sem a necessidade de provar dolo ou culpa) pelos atos lesivos praticados em seu interesse ou benefício. A responsabilidade da pessoa jurídica subsiste mesmo em casosar interesses ou a identidade dos beneficiários.
◦ No tocante a licitações e contratos: frustrar ou fraudar o caráter competitivo, impedir ou perturbar o procedimento, afastar licitantes por fraude, fraudar licitação ou contrato, criar pessoa jurídica fraudulenta para licitar, obter vantagem indevida em modificações/prorrogações contratuais, manipular ou fraudar o equilíbrio econômico-financeiro dos contratos.
◦ Dificultar atividade de investigação ou fiscal.
◦ Publicação extraordinária da decisão condenatória: em meios de comunicação de grande circulação.
◦ A aplicação das sanções não exclui a obrigação de reparação integral do dano causado.
• Programa de Integridade como Atenuante: A existência de mecanismos e procedimentos internos de integridade, auditoria e incentivo à denúncia de irregularidades e a aplicação efetiva de códigos de ética e de conduta no âmbito da pessoa jurídica será levada em consideração na aplicação das11 de Julho de 2022 (Decreto Anticorrupção) **
O Decreto nº 11.129/2022 revogou o Decreto nº 8.420/2015 e estabeleceu uma nova regulamentação para a Lei Anticorrupção. Ele é fundamental para a compreensão dos programas de integridade, pois define seus parâmetros e critérios de avaliação.
• Nova Definição de Programa de Integridade: O Art. 56 do Decreto nº 11.129/2022 estabelece que um Programa de Integridade consiste no conjunto de mecanismos e procedimentos internos de integridade, auditoria e incentivo à denúncia de irregularidades, e na aplicação efetiva de códigos de ética e de conduta, políticas e diretrizes, com o objetivo de:
◦ Prevenir, detectar e sanar desvios, fraudes, irregularidades e atos ilícitos praticados contra a administração pública, nacional ou estrangeira.
◦ Fomentar e manter uma cultura de integridade no ambiente organizacional.
• Programa "Tailor-Made": É fundamental que o programa de integridade seja estruturado, aplicado e atualizado de acordo com as características e os riscos atuais das atividades de cada pessoa jurídica. Não é possível a mera reprodução de modelos prontos, o programa deve ser customizado conforme os riscos apresentados na organização.
• Parâmetros para a Avaliação do Programa de Integridade: O Art. 57 do Decreto detalha os parâmetros para a estruturação e avaliação da qualidade e efetividade do programa. Incluem:
1. Comprometimento da alta administração.
2. Documentação de conformidade para o público interno (código de ética, políticas, mecanismos internos de integridade, etc.).
3. Mecanismos de integridade nas relações com terceiros, intermediários e associados.
4. Ações de treinamento e comunicação.
5. Gestão de riscos revisada periodicamente.
6. Registros contábeis completos e precisos.
7. Controles internos para a boa produção de relatórios e demonstrações financeiras.
8. Procedimentos específicos para prevenir atos ilícitos nos processos licitatórios e nas contratações com a Administração Pública.
9. Instância responsável com autoridade, independência e estrutura adequada.
10. Existência de canal de denúncias.
11. Medidas disciplinares.
12. Remédios adequados para as irregularidades.
13. Diligências apropriadas e baseadas em risco.
14. Due diligence nos processos de fusões, aquisições e reestruturações societárias.
15. Monitoramento e aprimoramento contínuos do programa de integridade.
• Relatório de Perfil e de Conformidade: A Portaria CGU nº 909/2015, que é complementada pelo Decreto, torna obrigatória a elaboração de um relatório de perfil e um relatório de conformidade para a avaliação do programa de integridade.
◦ O Relatório de Perfil traça o contexto da pessoa jurídica, indicando setores de atuação, presença nacional/internacional, estrutura organizacional, quantidade de colaboradores, interações com a Administração Pública, e qualificação como PME, entre outros.
◦ O Relatório de Conformidade descreve a estrutura do programa de integridade, as medidas implementadas, o modo de implementação, sua importância para a gestão de riscos e seu funcionamento no cotidiano da empresa, demonstrando seu papel na prevenção, detecção e remediação de irregularidades.
2.3. Lei nº 14.133, de 1º de Abril de 2021 (Nova Lei de Licitações e Contratos Administrativos - NLLC)
A NLLC inovou significativamente em relação ao tema de integridade e ESG nas contratações públicas, tornando o programa de integridade não apenas um atenuante, mas uma exigência em diversos cenários.
• Obrigatoriedade do Programa de Integridade para Contratos de Grande Vulto: O Art. 25, §4º, torna obrigatória a inclusão no edital da exigência de implementação de programa de integridade para o licitante vencedor de contratos de grande vulto. São considerados de grande vulto aqueles contratos cujo valor seja superior a R$ 200.000.000,00 (duzentos milhões de reais), valor que é atualizado periodicamente. O programa deve ser implementado no prazo de até 6 meses após a celebração do contrato.
• Programa de Integridade como Critério de Desempate: Em caso de empate entre propostas, um dos critérios a ser utilizado será o desenvolvimento de programa de integridade. Este critério é aplicado após a disputa final e a avaliação do desempenho contratual prévio dos licitantes.
• Programa de Integridade como Condição de Reabilitação: O Art. 163, parágrafo único, prevê que a elaboração de programa de integridade deverá ser condição para a reabilitação de licitante ou contratado que for declarado inidôneo.
• Consideração na Aplicação de Sanções: Assim como na Lei Anticorrupção, o Art. 156, V, da NLLC permite que a implementação ou aperfeiçoamento de programa de integridade seja considerada na aplicação de penalidades em caso de infrações administrativas.
• Matriz de Riscos: A NLLC inova ao definir a matriz de riscos como cláusula contratual definidora de riscos e responsabilidades entre as partes, caracterizando o equilíbrio econômico-financeiro inicial do contrato. É uma cláusula obrigatória em editais de licitação de grande vulto e nas contratações sob regime de contratação integrada ou semi-integrada. A matriz de riscos deve conter alocação eficiente dos riscos, responsabilidade das partes e mecanismos de afastamento/mitigação de efeitos. É importante considerar o risco de conformidade (compliance), pois atos de corrupção ou suborno podem afetar a execução dos serviços.
• Três Linhas de Defesa: A NLLC adota o modelo das "Três Linhas de Defesa", alinhado às melhores práticas de compliance e governança corporativa. A gestão de riscos e os mecanismos de controle/prevenção devem ser estruturados em:
1. Primeira linha: estrutura de governança do órgão/entidade, membros, servidores, agentes de licitação.
2. Segunda linha: unidade de assessoramento jurídico e controles internos do próprio órgão.
3. Terceira linha: órgão central de controle interno ou tribunal de contas (equivalente a auditorias externas no privado).
• Regras de ESG: A NLLC permite que o edital preveja normas de ESG, especialmente no aspecto "S" (Social). Exemplos incluem percentual mínimo de mão de obra a ser composto por mulheres vítimas de violência doméstica ou egressos do sistema prisional, ou ações de equidade de gênero como critério de desempate. No aspecto ambiental, podem ser previstas a responsabilidade do contratado por licenciamento ambiental ou margem de preferência para bens recicláveis/biodegradáveis.
Pergunta Reflexiva: "Com a exigência de programas de integridade em contratos de grande vulto pela Lei 14.133/2021, como as pequenas e médias empresas que aspiram a esses contratos podem se preparar para atender a essa demanda e competir de forma justa, considerando seus recursos limitados?"
2.4. Outras Normas Relevantes
• Lei nº 13.303/2016 (Lei das Estatais): Para empresas públicas e sociedades de economia mista, esta lei estabelece a obrigatoriedade de o estatuto social observar regras de governança, gestão de riscos, controles internos e transparência. Exige a elaboração e divulgação de um Código de Conduta e Integridade, que deve conter princípios e valores, orientações sobre conflito de interesses, canal de denúncias, mecanismos de proteção a denunciantes, sanções e previsão de treinamentos periódicos com a alta administração.
• Lei nº 8.429/1992 (Lei de Improbidade Administrativa): Preveem que a implementação de programa de integridade poderá ser prevista no acordo de não persecução civil em ações de improbidade administrativa, conforme alterações trazidas pela Lei nº 14.230/2021.
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Módulo 3: Elementos Estruturais de um Programa de Integridade Efetivo
A efetividade de um programa de integridade depende da existência e do bom funcionamento de diversos elementos interconectados. A Controladoria-Geral da União (CGU) recomenda cinco pilares básicos: comprometimento da liderança, estrutura responsável, análise de riscos, regras claras e monitoramento contínuo.
3.1. Apoio e Compromisso da Alta Administração
O comprometimento da alta direção é o primeiro e mais importante parâmetro para um Programa de Integridade eficaz, sendo a base para a criação de uma cultura de ética e integridade na empresa. Os líderes devem ser exemplos de conduta, garantindo a responsabilização em caso de irregularidades.
• Evidências de Compromisso (Tone at the Top):
◦ Seleção e Avaliação da Liderança: O histórico de conduta do candidato a cargo de liderança deve ser considerado na seleção, evitando envolvimento em corrupção, fraudes, assédios, violações de direitos humanos ou danos ambientais. As avaliações de desempenho da liderança devem incluir metas relacionadas à aplicação do Programa de Integridade e influenciar a remuneração variável. Bônus ou benefícios não devem ser concedidos a líderes que pratiquem irregularidades ou se omitam.
◦ Qualificação: Líderes devem ter conhecimento sobre integridade empresarial, políticas anticorrupção, critérios ASG e governança corporativa, e participar de treinamentos periódicos.
◦ Comunicação: A alta direção deve manifestar apoio inequívoco ao programa por meio de comunicados, mensagens, redes sociais, vídeos e reuniões. O discurso deve ser claro, frequente e, principalmente, refletido na prática e no processo decisório, promovendo tolerância zero à corrupção, respeito aos direitos humanos, combate ao assédio e discriminação, e importância do desenvolvimento sustentável.
◦ Recursos Destinados: A alta direção deve disponibilizar recursos financeiros, humanos, materiais e tecnológicos suficientes e compatíveis com o porte da empresa e os riscos das atividades, garantindo o funcionamento do programa.
◦ Aplicação de Sanções: A liderança deve garantir que irregularidades sejam devidamente sancionadas, independentemente do cargo do infrator, com medidas disciplinares proporcionais à gravidade da infração. A divulgação interna dessas sanções, sem expor dados sensíveis, fortalece a percepção de que as normas valem para todos.
Pergunta Reflexiva: "Que riscos surgem quando a alta administração não se compromete com a integridade e qual o impacto na credibilidade do programa e na cultura organizacional?"
3.2. Instância Responsável pelo Programa de Integridade
É crucial que exista uma instância (setor ou pessoa) responsável por liderar e coordenar o processo de implementação, aplicação e monitoramento do Programa de Integridade.
• Atribuições: Realizar análise de riscos, elaborar e atualizar políticas, oferecer suporte e orientação, disseminar a cultura de integridade, participar de tratamento e investigação de denúncias, prover informações à alta direção, monitorar a aplicação do programa e reportar resultados.
• Autonomia, Autoridade e Recursos:
◦ Formalização: Atribuições e garantias devem ser definidas formalmente, aprovadas pelo mais alto nível hierárquico, incluindo instâncias e periodicidade de reporte.
◦ Recursos: Devem ser garantidos recursos financeiros, materiais e humanos compatíveis com as características da empresa. A instância deve participar da elaboração do orçamento e ter contingenciamentos proporcionais aos de outras áreas.
◦ Qualificação: Profissionais com formação de nível superior, experiência em gestão de riscos, regulação e controles internos, e dispostos a constante atualização.
◦ Hierarquia: Posição hierárquica elevada, compatível com as demais áreas relevantes, para garantir autoridade e respeito.
◦ Reporte: Reporte direto ao nível hierárquico mais elevado, como o Conselho de Administração ou comitê assessor independente. Relatórios periódicos informam o estágio do programa, riscos, medidas adotadas e resultados.
◦ Supervisão: A instância também deve ser supervisionada pela alta direção e, se houver, auditada periodicamente pela auditoria interna.
• Observações: Não se deve confundir a instância interna responsável pela execução do programa com órgãos colegiados como Comitês de Ética, que possuem função supervisora e deliberativa. A terceirização integral da instância não é recomendável, embora a contratação de terceiros para atividades específicas (canais de denúncia, treinamentos, apoio em análise de riscos) seja possível, sob supervisão da instância interna.
3.3. Gestão de Riscos para Integridade
Conhecer os riscos para integridade é fundamental para implementar um Programa de Integridade eficaz e alocar recursos de forma eficiente. Negligenciar os riscos significa aumentar as chances de enfrentar problemas maiores, como prejuízos financeiros e danos à reputação.
• Identificação, Avaliação e Mitigação de Riscos:
◦ Vulnerabilidades: Avaliar quaisquer vulnerabilidades que aumentem a probabilidade de ocorrência de comportamentos que possam ter efeitos negativos na cultura de integridade, como abuso de posição ou poder, nepotismo, conflito de interesses e solicitação/recebimento de vantagem indevida.
◦ Tipos de Eventos: Não se limitar a grandes casos de corrupção, mas considerar também eventos do dia a dia, como concessão de vantagem indevida de pequeno valor a servidores, fraudes em projetos culturais, compra de informações sigilosas, burlas a fiscalização (adulteração de produtos), pagamento de vantagem indevida a fiscal, emissão de garantias falsas em contratos públicos, uso de empresas de fachada para pagamentos indevidos, omissão em supervisão de obras públicas, obtenção fraudulenta de bases de dados bancários.
◦ Riscos Ambientais: Questões relacionadas à preservação ambiental devem ser tratadas, especialmente para empresas que contratam ou pretendem contratar com o Poder Público, dada a possibilidade de sanção de inidoneidade por infrações ambientais (Art. 155, X, da Lei nº 14.133/2021).
• Metodologia de Gestão de Riscos: O processo deve ser permanente, estabelecido, direcionado e monitorado pela alta administração, contemplando as atividades de identificar, avaliar e gerenciar potenciais eventos. As empresas devem identificar seus riscos para integridade, classificá-los de acordo com probabilidade e impacto, priorizá-los e definir medidas mitigatórias, com designação de responsáveis e prazos. É um processo periódico, coordenado pela instância de integridade e supervisionado pela alta direção.
• Análise Multifatorial de Riscos vs. Critério de Valor:
◦ A NLLC adota o critério do valor (contratos acima de R$ 200 milhões) para fixar a obrigatoriedade do programa de integridade, mas este é um critério unidimensional e, por vezes, excessivamente alto para a realidade de muitas contratações.
◦ Uma análise multifatorial é mais recomendável, considerando fatores como localização geográfica (risco de corrupção), objeto do contrato (merenda escolar, equipamentos médicos), e qualidade do contratado (Pessoa Exposta Politicamente - PEP, sócio de administrador público). Essa análise deve ser feita a priori (antes da licitação) e a posteriori (após conhecido o vencedor), com metodologia clara e objetiva definida em atos normativos infralegais.
Pergunta Reflexiva: "Além do valor do contrato, quais outros fatores de risco de integridade deveriam ser prioritariamente considerados pelas entidades públicas na avaliação de um programa de integridade, especialmente para evitar os 'Compliance de papel'?"
3.4. Padrões de Conduta (Código de Ética, Políticas e Procedimentos)
Os padrões de conduta definem o comportamento esperado das lideranças, colaboradores e parceiros de negócio para a manutenção de uma cultura de integridade.
• Código de Ética: É o documento que estabelece os princípios e valores da empresa. Recomenda-se que o Código:
◦ Explicite tolerância zero com corrupção e fraudes.
◦ Manifeste compromisso com direitos humanos e meio ambiente.
◦ Proíba assédio e discriminação, promovendo diversidade.
◦ Vede exploração de trabalho infantil e análogo ao escravo.
◦ Incentive o uso de canais de denúncias e garanta proteção ao denunciante.
◦ Preveja sanções para violações, independentemente do cargo.
◦ Seja aprovado pela alta direção e facilmente acessível (página eletrônica institucional).
◦ Deve refletir a cultura da empresa e usar linguagem adequada ao público. Empresas multinacionais devem ter versão em português e adaptada à legislação brasileira.
• Políticas e Procedimentos Internos: Complementam o Código de Ética, tratando de riscos específicos e estabelecendo regras, controles e responsabilidades para mitigar irregularidades. Temas comuns incluem:
◦ Relacionamento com o setor público (licitações, contratos administrativos).
◦ Concessão e recebimento de brindes, presentes e hospitalidades.
◦ Política de diligências e contratação de terceiros.
◦ Realização de doações e patrocínios.
◦ Fusões e aquisições.
• Características das Políticas:
◦ Devem ser instituídas formalmente, com aprovação da alta direção.
◦ Operacionais, com regras claras, fluxos e procedimentos, e responsáveis definidos.
◦ Proporcionais aos riscos, com alçadas de aprovação e monitoramento (ex: controles mais rigorosos para transações com instituições públicas ou Pessoas Expostas Politicamente - PEPs).
◦ Compatíveis com a legislação nacional (ex: regras para brindes a agentes públicos).
◦ Facilmente acessíveis aos funcionários e interessados.
◦ Aplicação devidamente documentada e registrada.
• Políticas para Prevenção de Ilícitos em Licitações e Contratações Públicas: Recomenda-se que contemplem:
◦ Mapeamento prévio de riscos para integridade na licitação/contrato.
◦ Verificação da capacidade de atender às condições do certame.
◦ Indicação dos responsáveis por aprovar a participação da empresa.
◦ Condutas esperadas de colaboradores e terceiros (o que é permitido/proibido).
◦ Proibição expressa de combinação de preços ou conluio com concorrentes.
◦ Rotatividade dos responsáveis pela interação com agentes públicos na gestão de contratos longos.
◦ Definição de alçadas internas para gestão de contratos (ex: manifestação da integridade para aditivos).
◦ Necessidade de reavaliação periódica dos riscos do contrato.
◦ Transparência sobre licitações e contratos com a Administração Pública (publicação em página eletrônica).
• Inclusão de Assédio, Discriminação, Direitos Humanos e Sustentabilidade: As políticas devem abordar a prevenção de assédio e discriminação (referência ao "Guia Lilás" da CGU). Também devem tratar do respeito aos direitos humanos e sustentabilidade ambiental, alinhadas aos 10 Princípios Orientadores do Pacto Global da ONU, que incluem trabalho decente, eliminação de discriminação e combate à corrupção.
3.5. Canais de Denúncia
Os canais de denúncia são uma das principais formas de detectar irregularidades e uma das ferramentas mais importantes do programa de compliance. Eles aumentam a credibilidade das ações e auxiliam na prevenção e combate a irregularidades.
• Disponibilidade e Acessibilidade:
◦ Em Português: Indispensável que o canal esteja disponível em português, desde o acesso até o relato da denúncia, especialmente para empresas multinacionais.
◦ Fácil Acesso: Tanto para o público interno quanto externo, preferencialmente em local visível na página institucional da empresa na internet.
◦ Distinção Clara: Não deve ser confundido com Serviço de Atendimento ao Consumidor (SAC), deixando claro que é para denúncias de irregularidades (corrupção, fraude, assédio, direitos humanos, etc.).
• Proteção do Denunciante:
◦ Incentivo e Garantias: A empresa deve incentivar as denúncias e garantir que não haverá qualquer tipo de retaliação ao denunciante. As garantias de não-retaliação, anonimato e confidencialidade devem estar expressas no próprio canal.
◦ Exemplo Prático (DF): A previsão, por lei, de incluir o telefone da ouvidoria geral em todo contrato público no Distrito Federal é uma boa prática para estimular denúncias.
• Acompanhamento da Denúncia: Canais que permitem ao denunciante acompanhar o andamento da denúncia contribuem para a transparência e credibilidade do processo de apuração.
• Processo de Apuração e Aplicação de Sanções:
◦ Políticas e Procedimentos: Devem existir políticas e procedimentos definidos para o tratamento e apuração das denúncias, com indicação clara dos responsáveis por cada etapa.
◦ Fluxos Específicos: Para denúncias que envolvem membros da alta direção, devem ser estabelecidos fluxos específicos para evitar interferências.
◦ Interrupção Imediata: Ao detectar uma possível irregularidade, providências devem ser tomadas rapidamente para interromper sua continuidade (restrição de acesso a sistemas, afastamento preventivo, suspensão de contratos).
◦ Sanção Proporcional: Confirmada a irregularidade, o infrator deve ser imediatamente sancionado de acordo com as políticas estabelecidas, independentemente do cargo, com medidas disciplinares proporcionais à gravidade da infração.
◦ Divulgação Interna: A divulgação periódica de informações gerais sobre apurações e sanções (sem expor dados sensíveis) exerce um efeito dissuasório e fortalece a cultura de integridade.
◦ Preservação de Evidências: A empresa deve preservar todas as evidências da irregularidade para uso em eventual processo de colaboração com autoridades, o que pode gerar benefícios financeiros (redução de multas).
Pergunta Reflexiva: "Como um canal de denúncias pode ser eficaz se os funcionários temem retaliação ou duvidam que as denúncias serão levadas a sério, e que medidas podem ser tomadas para construir essa confiança?"
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Módulo 4: Monitoramento Contínuo e Exemplos Práticos
Um Programa de Integridade não é estático; ele precisa ser dinâmico e continuamente monitorado para garantir sua efetividade e adaptação a novos riscos.
4.1. Treinamento e Comunicação
São essenciais para que o Programa de Integridade seja conhecido, internalizado e aplicado na empresa, além de fomentar a cultura de integridade.
• Estratégias de Comunicação e Capacitação:
◦ Planejamento e Periodicidade: Devem ser planejadas e realizadas de forma periódica, por diferentes meios (vídeos, online, presenciais) e considerando o público específico.
◦ Público-alvo: Treinamentos específicos devem ser desenvolvidos com base nos riscos identificados, direcionados a indivíduos em funções de alto risco, garantindo amplo conhecimento sobre os riscos e a aplicação das medidas de integridade.
◦ Avaliação de Impacto: É crucial avaliar o impacto e a efetividade dos treinamentos por meio de comparações estatísticas, testes, simulados e pesquisas de percepção, para identificar lacunas e oportunidades de melhoria.
• O Papel da Liderança na Comunicação: O exemplo da liderança é uma ferramenta poderosa. O conteúdo das mensagens deve refletir as ações e a forma de condução dos negócios da empresa. Em caso de irregularidades, a empresa deve agir com transparência, comunicando os fatos, as ações de interrupção e remediação, e as sanções aplicadas, reforçando o compromisso com a integridade.
• Transparência Institucional: A empresa deve divulgar em sua página eletrônica informações sobre sua estrutura de governança, principais interações com a Administração Pública (licitações, contratos, doações/patrocínios), políticas de integridade e relatórios de desempenho ambiental, social e de governança (ASG).
4.2. Controles Contábeis
Procedimentos robustos e confiáveis para os registros contábeis são fundamentais para prevenir e mitigar riscos de práticas ilícitas, como propinas e pagamentos indevidos, que muitas vezes são ocultados por meio de lançamentos fraudulentos.
• Políticas e Procedimentos Rigorosos: Devem estabelecer segregação de funções, níveis de aprovação para receitas, despesas e movimentações patrimoniais, e mecanismos de alerta para identificar despesas/receitas fora do padrão. É recomendada a verificação do cumprimento do objeto do contrato antes dos pagamentos.
• Sistemas Informatizados: O investimento em soluções tecnológicas e sistemas informatizados customizados é crucial para gerenciar registros e operações, garantindo confiabilidade, controle e rastreabilidade.
• Auditoria Interna e Externa: A constituição de uma área de auditoria interna e/ou a contratação de serviços de auditoria externa especializada assegura as "Três Linhas de Defesa", evitando a centralização de decisões e promovendo integridade e transparência.
4.3. Diligências de Terceiros (Due Diligence)
A realização de diligências apropriadas, baseadas em risco, para contratação e supervisão de terceiros é um parâmetro essencial do Programa de Integridade.
• Importância: Conhecer os parceiros de negócio não apenas mitiga riscos de irregularidades, mas também permite escolher parceiros que compartilham valores éticos.
• Ferramentas e Fontes de Informação:
◦ Bancos de Dados Públicos: Utilização do Cadastro Nacional de Empresas Inidôneas e Suspensas (CEIS), Cadastro de Entidades Privadas Sem Fins Lucrativos Impedidas (CEPIM), Cadastro Nacional de Empresas Punidas (CNEP), sistema de Certidões da CGU (CGU-PAD), e o Cadastro de Empregadores que tenham submetido trabalhadores a condições análogas à de escravo.
◦ Avaliação Abrangente: Além de histórico de corrupção e fraude, deve-se avaliar o envolvimento em violações éticas (direitos humanos, danos ambientais) e buscar informações positivas (Programa Pró-Ética, Pacto Global).
• Supervisão Contínua e Red Flags: As empresas devem supervisionar constantemente os terceiros e refazer diligências periodicamente. Estar atento a "red flags", como solicitações de pagamentos inusuais (em espécie, moeda estrangeira, múltiplas contas), comissões excessivas, descrição vaga de serviços, contratação de Pessoas Expostas Politicamente (PEPs) ou seus familiares, e notícias desabonadoras na mídia. Suspeitas devem ser investigadas e, se confirmadas, podem levar à alteração do perfil de risco, aprimoramento de controles ou rescisão contratual.
• Cláusulas Contratuais: Os contratos devem incluir cláusulas que estabeleçam a obrigatoriedade de observância de normas éticas, vedação de fraudes/corrupção e desrespeito a direitos, bem como a possibilidade de sanções (inclusive rescisão e indenização) em caso de descumprimento.
• Due Diligence em Fusões e Aquisições (M&A): Em operações societárias, é crucial verificar o compromisso com a integridade das empresas-alvo, seus sócios e executivos, mapeando histórico de ilícitos e outras violações éticas.
4.4. Monitoramento e Aprimoramento Contínuo
O Programa de Integridade é um processo dinâmico que exige monitoramento contínuo para identificar e tratar falhas, aperfeiçoar medidas existentes e desenvolver mitigações para novos riscos.
• Planejamento e Execução: O monitoramento deve ser planejado, estruturado e documentado, com definição de responsáveis (especialmente a instância de integridade) e periodicidade.
• Indicadores e Metas de Desempenho (KPIs): Devem ser simples, objetivos e específicos, buscando captar informações relevantes sobre a aplicação e evolução do programa. Exemplos incluem taxas de participação em treinamentos, tempo de apuração de denúncias, percentual de due diligence realizada em terceiros, número de violações de políticas e percepção dos funcionários sobre o compromisso da alta direção. Metas alcançáveis devem ser definidas, e o não atingimento deve impactar a avaliação e remuneração da liderança.
• Pesquisas de Percepção: Ferramentas úteis para avaliar o conhecimento e engajamento dos funcionários e a percepção do comprometimento da liderança com a cultura de integridade.
• Reporte: Os resultados do monitoramento devem ser padronizados e compartilhados com os níveis hierárquicos mais elevados da empresa, como o Conselho de Administração ou comitês de assessoramento.
4.5. Exemplos Práticos de Aplicação no Setor Público
A implementação de programas de integridade nas contratações públicas já é uma realidade em diversos entes federativos no Brasil, com desafios e abordagens variadas.
• Critério de Valor para Obrigatoriedade:
◦ A NLLC (federal) exige programa de integridade para contratos de grande vulto (atualmente, acima de R$ 216.081.640,00).
◦ Leis Estaduais e Distritais tendem a fixar valores proporcionalmente menores, refletindo suas realidades orçamentárias. Exemplos:
▪ Rio de Janeiro (Lei nº 7.753/2017): R$ 1.500.000,00 para obras/serviços de engenharia e R$ 650.000,00 para compras/serviços, com duração igual ou superior a 180 dias.
▪ Distrito Federal (Lei nº 6.112/2018): Entre R$ 80.000,00 e R$ 650.000,00 para acordos superiores a 180 dias, para qualquer tipo de contrato.
▪ Rio Grande do Sul (Lei nº 15.228/2018): R$ 3.300.000,00 para obras/serviços de engenharia e R$ 1.430.000,00 para compras/serviços, prazo igual ou superior a 180 dias.
▪ Pernambuco (Lei nº 16.722/2019): R$ 10.000.000,00 para obras/serviços de engenharia e gestão (com redução a R$5.000.000,00 a partir de 2024), e R$ 10.000.000,00 para contratos administrativos em geral.
◦ Crítica ao critério unidimensional: Muitos especialistas criticam o critério exclusivo de valor, sugerindo a adoção de uma análise multifatorial de riscos.
• Experiências e Desafios Estaduais:
◦ Rio de Janeiro: Pioneiro na exigência de PI. O gestor de contratos é responsável pela fiscalização da implantação do programa. A avaliação considera 16 critérios.
◦ Rio Grande do Sul: Lei única que disciplina a obrigatoriedade do PI e o regulamenta como atenuante da Lei Anticorrupção. Adota um sistema autodeclaratório (SCPI) para a análise dos requisitos, podendo conceder certificado de cumprimento. Exige transparência de doações de sócios/administradores para candidatos e partidos.
◦ Distrito Federal: Valores de contratação para obrigatoriedade são relativamente menores. Utiliza ferramenta de cruzamento de dados para avaliar o porte da empresa. Prevê que todo contrato contenha o telefone da ouvidoria geral, estimulando denúncias.
◦ Espírito Santo: Possui lei que exige adesão a um Código de Conduta pré-estruturado pela própria lei, mas não formalmente um programa de integridade. Contudo, há projetos de lei em tramitação para adotar o modelo de outros estados. O TCE/ES adota matriz de responsabilização e usa inteligência artificial para previsão de obras paralisadas.
◦ Minas Gerais: Não possui lei estadual específica que exija PI em contratações, mas a CGE-MG é referência em boas práticas. Utiliza inteligência artificial para rastreio de editais, sócios e bens de luxo de empresas contratadas. Desenvolveu um Guia de Integridade para instituições privadas.
◦ Mato Grosso: Lei exige PI e prevê comissão de avaliação formada por CGE, PGE e Secretaria de Estado da Fazenda.
◦ Pernambuco: Criou um certificado de regularidade do programa de integridade, emitido pelo órgão avaliador, com validade de dois anos e fé pública.
◦ Desafios: A dificuldade de pequenas e médias empresas em se adequar às exigências, a fiscalização da administração pública, e o risco de "Compliance de papel" (programas apenas formais, sem efetividade). A banalização de certificados também é uma preocupação.
Pergunta Reflexiva: "Considerando os desafios na avaliação da efetividade dos programas de integridade, como os órgãos de controle podem ir além da verificação formal de documentos e assegurar que as empresas contratadas realmente cultivam uma cultura de integridade?"
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Conclusão
Chegamos ao fim da Parte 1 da nossa aula sobre Programas de Integridade e Compliance nas Contratações Públicas. Vimos que a integridade é um pilar essencial para as relações entre o setor público e privado no Brasil. A legislação atual, com destaque para a Lei nº 12.846/2013, o Decreto nº 11.129/2022 e a Lei nº 14.133/2021, não apenas incentiva, mas em muitos casos, exige a implementação de programas de integridade.
Exploramos a importância de uma liderança comprometida, a necessidade de uma gestão de riscos robusta e políticas internas claras e adaptadas, além da vitalidade dos treinamentos, canais de denúncia e um monitoramento contínuo. Os exemplos práticos de diferentes estados mostram que, embora haja desafios, o caminho para uma cultura de integridade está sendo construído, visando maior transparência, ética e eficiência nas contratações públicas.
A integridade não é apenas uma exigência legal, mas um diferencial competitivo e um compromisso com o desenvolvimento sustentável da empresa e da sociedade.
Próximos passos: Na Parte 2 desta aula, aprofundaremos aspectos como as investigações internas, as sanções e remediações, e as melhores práticas para aprimoramento contínuo dos programas de integridade.
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Referências
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BRASIL. Lei nº 12.846, de 1º de agosto de 2013. Diário Oficial [da] República Federativa do Brasil, Brasília, DF. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2013/lei/l12846.htm. Acesso em: 16 fev. 2024.
BRASIL. Lei nº 14.133, de 1º de abril de 2021. Diário Oficial [da] República Federativa do Brasil, Brasília, DF. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019-2022/2021/lei/l14133.htm. Acesso em: 16 fev. 2024.
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CONLICITAÇÃO. Programa de Integridade: conceito e aplicação em licitações e empresas privadas. [S. l.]: ConLicitação, 2 abr. 2025. Disponível em: https://www.conlicitacao.com.br/blog/gestao-de-contratos/programa-de-integridade/. Acesso em: 16 fev. 2024.
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PROJURIS. Compliance Trabalhista: o que é, vantagens e como aplicar. [S. l.]: Projuris, 14 out. 2024. Disponível em: https://www.projuris.com.br/compliance-trabalhista-o-que-e-vantagens-e-como-aplicar/. Acesso em: 16 fev. 2024.
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