Responsabilidade dos gestores públicos nas contratações - Parte 2

 

Objetivos de Aprendizagem: Ao final desta aula, Você será capaz de:

• Identificar situações comuns que podem levar à responsabilização de gestores públicos em contratações.

• Distinguir e compreender as diferentes esferas de responsabilização: administrativa, civil e penal.

• Conhecer os crimes específicos relacionados a licitações e contratos administrativos previstos no Código Penal.

• Entender o papel e a atuação dos órgãos de controle, como TCU, CGU e controladorias internas.

• Aplicar estratégias preventivas e de compliance para mitigar riscos de responsabilização nas contratações públicas.

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1. Introdução à Responsabilidade e Esferas de Atuação

Nesta segunda parte da nossa aula sobre responsabilidade dos gestores públicos nas contratações, aprofundaremos nas aplicações práticas e nas consequências que podem advir de atos ou omissões na gestão. Entenderemos como a Nova Lei de Licitações e Contratos Administrativos (Lei nº 14.133/2021) e outros diplomas legais moldam o ambiente de responsabilização.

1.1. Conceito de Agente Público e Responsabilidade

Um agente público é qualquer indivíduo que exerce mandato, cargo, emprego ou função em pessoa jurídica da Administração Pública, seja por eleição, nomeação, designação, contratação ou qualquer outra forma de vínculo. Dentro do contexto das licitações e contratos, destacam-se figuras como o agente de contratação, que toma decisões e impulsiona o procedimento licitatório até a homologação, sendo auxiliado por uma equipe de apoio e respondendo individualmente pelos seus atos, salvo indução a erro. O pregoeiro é o agente de contratação responsável pela condução de licitações na modalidade pregão.

Há também o gestor do contrato, agente público ou comissão designada pela autoridade competente para coordenar a fiscalização da execução contratual e os atos preparatórios à instrução processual, incluindo prorrogação, alteração, reequilíbrio, pagamento, aplicação de sanções e extinção de contratos. O fiscal do contrato é o agente público que auxilia o gestor, avaliando a execução do objeto quanto aos aspectos técnicos e administrativos e realizando o recebimento provisório. A Lei nº 14.133/2021 prevê a figura do terceiro contratado, civil e objetivamente responsável pela veracidade e precisão das informações prestadas, mas que não exime o fiscal de sua responsabilidade.

1.2. Visão Geral das Esferas de Responsabilização

A responsabilização dos agentes públicos pode ocorrer em três esferas distintas e, por vezes, independentes: administrativa, civil e penal.

Responsabilização Administrativa: Resulta de atos ou omissões que configuram infrações às normas internas da Administração ou à legislação específica de licitações e contratos. As sanções são aplicadas pela própria Administração.

Responsabilização Civil: Decorre de danos materiais causados ao erário público, obrigando o agente a ressarcir os prejuízos. Frequentemente associada a ações de improbidade administrativa.

Responsabilização Penal: Ocorre quando a conduta do agente público configura um crime tipificado na legislação penal, como os crimes em licitações e contratos administrativos. As penas são aplicadas pelo Poder Judiciário.

É importante ressaltar que a responsabilidade solidária ocorre quando dois ou mais agentes públicos respondem conjuntamente por uma irregularidade, especialmente quando há omissão ou conivência. Isso significa que não apenas quem comete o erro diretamente, mas também quem tinha o dever de agir ou fiscalizar e se omitiu, pode ser responsabilizado.

1.3. Princípios Fundamentais e Governança nas Contratações

A Lei nº 14.133/2021 trouxe inovações e diretrizes para a atuação dos agentes públicos, buscando fortalecer a governança e mitigar riscos. Entre os princípios e conceitos essenciais, destacam-se:

Segregação de Funções: Este princípio, consagrado na doutrina e jurisprudência e agora com status de diretriz geral na Lei nº 14.133/2021 (art. 5º, 7º, §1º), visa garantir o melhor desempenho e a mitigação de riscos. Ele veda a designação do mesmo agente público para atuação simultânea em funções mais suscetíveis a riscos, como a elaboração do edital, a avaliação de propostas e a fiscalização do contrato. A inobservância desse princípio pode facilitar a ocultação de erros e a ocorrência de fraudes.

Prevenção de Conflito de Interesses: A Lei proíbe a designação de agentes públicos para funções essenciais à execução da Lei se tiverem vínculos (cônjuge, companheiro, parente até o terceiro grau, ou vínculos técnicos, comerciais, econômicos, financeiros, trabalhistas ou civis) com licitantes ou contratados habituais da Administração. Agentes públicos de órgãos licitantes ou contratantes não podem participar direta ou indiretamente da disputa ou da execução do contrato.

Governança das Contratações: A alta administração dos órgãos e entidades é responsável por implementar processos e estruturas, incluindo gestão de riscos e controles internos, para avaliar, direcionar e monitorar os processos licitatórios e contratos, visando agregar valor e alcançar os objetivos públicos com riscos aceitáveis.

Pergunta Reflexiva: Qual a importância da segregação de funções para a prevenção de responsabilidades? Pense em um cenário hipotético em que essa segregação não é observada: quais seriam os riscos?

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2. Exemplos Práticos de Responsabilização e Consequências Administrativas

Nesta hora, exploraremos situações concretas que podem levar à responsabilização de gestores e detalharemos as consequências na esfera administrativa.

2.1. Situações Comuns de Responsabilização de Gestores

A atuação dos gestores públicos nas contratações é complexa e exige a observância de inúmeras normas. A não conformidade ou a má-fé podem gerar sérias consequências.

Ato Irregular com Base em Parecer Técnico Equivocado: Um gestor pode ser responsabilizado mesmo que tenha agido com base em um parecer técnico ou jurídico. Se o erro no parecer for de fácil constatação por uma pessoa com conhecimento ordinário, ou se o gestor detinha condições de confirmar a legitimidade do conteúdo, ele poderá responder solidariamente com o parecerista por erro grosseiro ou grave inobservância do dever de cuidado. A não observância do que foi proposto pela Assessoria Jurídica também pode ensejar responsabilização e impedir o agente público de se valer da advocacia pública para sua defesa.

    ◦ Exemplo Prático: Um secretário de obras autoriza a contratação direta de uma empresa para um serviço de engenharia de alta complexidade, baseando-se em um parecer técnico que afirma a inviabilidade de competição. No entanto, o parecer contém erros grosseiros, como a descrição de um objeto que não corresponde à realidade do mercado, ou a ausência de pesquisa de mercado que demonstraria a existência de múltiplos fornecedores. Se o secretário, mesmo sem ser engenheiro, tinha acesso a informações claras que contradiziam o parecer (ex: experiências anteriores do próprio órgão), ele pode ser responsabilizado por ter acatado o parecer sem a devida diligência.

Omissão na Fiscalização de Contratos: O gestor do contrato e os fiscais são responsáveis por coordenar e acompanhar as atividades de fiscalização da execução contratual, registrando ocorrências e informando à autoridade superior sobre problemas que excedam sua competência. A falha na fiscalização do cumprimento das obrigações do contratado, especialmente em serviços contínuos com dedicação exclusiva de mão de obra, pode gerar responsabilidade solidária pelos encargos previdenciários e subsidiária pelos encargos trabalhistas.

    ◦ Exemplo Prático: O fiscal de um contrato de limpeza terceirizada deixa de acompanhar a frequência da equipe, a qualidade dos materiais utilizados e a regularidade do pagamento dos funcionários da empresa contratada. Posteriormente, descobre-se que a empresa não pagava os direitos trabalhistas e previdenciários. A omissão do fiscal e do gestor na fiscalização pode levá-los à responsabilização.

Descumprimento de Deveres na Gestão Contratual: A Lei nº 14.133/2021 estabelece diversas atribuições para gestores e fiscais de contrato, como manter as condições de habilitação do contratado, coordenar a rotina de acompanhamento, elaborar relatório final e tomar providências para processo de responsabilização. O descumprimento dessas responsabilidades pode levar à responsabilização.

Designação Inadequada de Agentes Públicos: A autoridade máxima da organização tem a responsabilidade de promover a gestão por competências e designar agentes públicos para funções essenciais que preencham requisitos específicos, como ser servidor efetivo, ter atribuições relacionadas a licitações e contratos ou qualificação compatível, e não ter conflito de interesses. A não observância desses critérios, como a designação de um agente sem a devida qualificação ou em conflito de interesses, pode resultar na responsabilização dos líderes das organizações públicas.

Contratação Direta Indevida (Erro Grosseiro ou Ilegalidade): A contratação direta fora das hipóteses legais (dispensa ou inexigibilidade) ou a inobservância das formalidades pertinentes pode configurar ilegalidade. Se houver dolo, fraude ou erro grosseiro, o contratado e o agente público responsável responderão solidariamente pelo dano causado ao erário.

Falsidade em Informações de Habilitação: A Lei nº 14.133/2021 expressamente prevê que o licitante responderá pela veracidade das informações referentes à sua habilitação. Caso se verifique falsidade, o declarante cometerá infração (inciso VIII do art. 155 da Lei) e será responsabilizado administrativamente. O agente público que aceita essa informação falsa sem a devida diligência também pode ser responsabilizado.

2.2. Consequências Administrativas

As sanções administrativas são penalidades aplicadas pela própria Administração Pública, visando a prevenir irregularidades, punir condutas e reparar danos. A Lei nº 14.133/2021 detalha as infrações e suas respectivas sanções.

Advertência: Sanção de caráter pedagógico, aplicada em casos de inexecução parcial do contrato quando não se justifica penalidade mais grave.

Multa: Gera efeito pecuniário. Pode variar de 0,5% a 30% do valor do contrato e ser aplicada cumulativamente a outras sanções.

Impedimento de licitar e contratar: Impede o licitante ou contratado de participar de licitações e contratar com a Administração Pública do ente federativo que aplicou a sanção, por até 3 anos.

Declaração de inidoneidade: Sanção mais grave, que impede o licitante ou contratado de participar de licitações e contratar com toda a Administração Pública (União, Estados, DF e Municípios), por um período de 3 a 6 anos.

Processo Administrativo Disciplinar (PAD): Para servidores públicos, infrações podem gerar a abertura de PAD, com sanções que podem incluir suspensão, demissão ou cassação de aposentadoria, conforme a Lei nº 8.112/1990 e leis orgânicas estaduais/municipais.

As sanções devem ser proporcionais à gravidade da infração e ao dano causado, considerando as circunstâncias agravantes ou atenuantes e os antecedentes do agente. A implementação ou aperfeiçoamento de programa de integridade pode ser considerada na dosimetria da pena. Os dados das sanções devem ser registrados no Cadastro Nacional de Empresas Inidôneas e Suspensas (Ceis) e no Cadastro Nacional de Empresas Punidas (Cnep).

Perguntas Reflexivas: Um gestor que age com base em um parecer técnico equivocado, sem ter conhecimento técnico para avaliá-lo, sempre será responsabilizado? Qual a diferença crucial entre impedimento de licitar e declarar inidoneidade?

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3. Consequências Civis e Penais em Licitações e Contratos

Nesta etapa da aula, abordaremos as consequências civis e, em seguida, detalharemos os crimes em licitações e contratos administrativos, conforme o Código Penal.

3.1. Consequências Civis

A responsabilidade civil do gestor público surge quando sua conduta, por ação ou omissão, causa um dano ao erário. A principal consequência é o dever de indenizar o poder público pelo prejuízo causado.

Além do ressarcimento direto, a responsabilidade civil pode se concretizar por meio de Ações de Improbidade Administrativa, regidas pela Lei nº 8.429/1992. Atos de improbidade podem resultar em diversas sanções, como a perda da função pública, suspensão dos direitos políticos, ressarcimento integral do dano, pagamento de multa civil e proibição de contratar com o Poder Público. As fontes mencionam a lei, mas não detalham as sanções específicas da improbidade.

No caso de pareceristas (técnicos ou jurídicos), a responsabilidade civil é avaliada com cautela. O Supremo Tribunal Federal (STF) já se posicionou no sentido de que o parecerista somente será civilmente responsável pelos danos se decorrentes de erro grave, inescusável, ou de ato ou omissão praticado com culpa em sentido amplo. Para o Tribunal de Contas da União (TCU), existindo parecer que, por dolo ou culpa, induza o administrador público à prática de irregularidade, ilegalidade ou atos que firam princípios da administração pública, haverá responsabilidade solidária entre gestores e pareceristas.

3.2. Consequências Penais: Crimes em Licitações e Contratos (Código Penal)

A Lei nº 14.133/2021 (Nova Lei de Licitações) trouxe uma importante alteração ao Código Penal (Decreto-Lei nº 2.848/1940), transferindo a tipificação dos crimes relacionados a licitações e contratos do antigo diploma legal (Lei nº 8.666/1993) para o Capítulo II-B do Título XI da Parte Especial do Código Penal. Essa mudança teve como objetivo fortalecer o combate à corrupção e às fraudes nesses processos, inserindo 11 novos tipos penais.

Embora as fontes não detalhem todos os 11 crimes, elas mencionam especificamente alguns exemplos:

Art. 337-F – Contratação direta ilegal: Este crime ocorre quando há recusa ou dispensa de licitação fora das hipóteses previstas em lei ou quando não são observadas as formalidades pertinentes, resultando em dano ao erário. A pena é de reclusão, de 4 (quatro) a 8 (oito) anos, e multa.

    ◦ Exemplo Prático: Um gestor municipal, para beneficiar uma empresa de um amigo, realiza uma contratação por dispensa de licitação para um serviço que não se enquadra nas hipóteses legais de dispensa, causando um prejuízo financeiro ao município.

Art. 337-I – Impedimento, perturbação ou fraude à realização de qualquer ato de processo licitatório: A Lei nº 14.133/2021 (art. 178) alterou o Código Penal para incluir este artigo, que prevê pena de detenção, de 6 (seis) meses a 3 (três) anos, e multa, para quem “Impedir, perturbar ou fraudar a realização de qualquer ato de processo licitatório”.

    ◦ Exemplo Prático: Um gestor público, com a intenção de favorecer determinado licitante, divulga informações privilegiadas sobre o edital antes da publicação oficial, ou manipula documentos para desclassificar concorrentes legítimos.

Art. 337-O – Omissão grave de dado ou de informação por projetista: Este crime é cometido por projetista que omite, modifica ou entrega à Administração Pública levantamento cadastral ou condição de contorno em desacordo com a realidade. Tal ação deve ter o potencial de causar grave dano ao erário, inviabilizar ou onerar indevidamente a execução da obra ou serviço, ou frustrar o caráter competitivo da licitação. A pena é de reclusão, de 6 (seis) meses a 3 (três) anos, e multa.

    ◦ Exemplo Prático: Um engenheiro responsável pelo projeto de uma obra pública omite informações cruciais sobre as condições do solo ou altera dados técnicos para reduzir custos iniciais, mas que, na execução, geram aditivos contratuais exorbitantes e prejuízo ao erário. Um exemplo de erro possível é a não previsão de condições de acesso e uso específicas para pessoas com deficiência ou com mobilidade reduzida, conforme norma técnica aplicável.

Perguntas Reflexivas: Em que casos a responsabilidade civil do gestor se estende ao parecerista jurídico ou técnico? Por que a Lei nº 14.133/2021 optou por transferir os crimes licitatórios para o Código Penal?

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4. Atuação dos Órgãos de Controle

Nesta hora, examinaremos o papel fundamental dos órgãos de controle na fiscalização das contratações públicas e como eles interagem com a Administração e a sociedade.

4.1. O Sistema de Controle nas Contratações Públicas

A Lei nº 14.133/2021 estabelece que as contratações públicas devem se submeter a práticas contínuas e permanentes de gestão de riscos e de controle preventivo, inclusive com o uso de tecnologia da informação. Para isso, a Lei adotou a modelagem das Três Linhas de Defesa:

Primeira Linha de Defesa: Integrada pelos servidores e agentes públicos que executam diretamente o processo licitatório e as autoridades de governança. Sua responsabilidade é implementar e manter controles internos diários, gerenciar riscos operacionais e garantir a conformidade.

Segunda Linha de Defesa: Composta pelas unidades de assessoramento jurídico e de controle interno do próprio órgão ou entidade. Essa linha apoia e orienta os agentes da primeira linha na análise de conformidade, monitora a implementação dos controles e da gestão de riscos, e aponta possíveis falhas ou melhorias.

Terceira Linha de Defesa: Inclui o órgão central de controle interno da Administração e o Tribunal de Contas competente. Atua de forma independente, avaliando as práticas das duas primeiras linhas, exarando recomendações, apontando falhas, solicitando medidas corretivas e aplicando sanções.

Quando impropriedades formais são detectadas por qualquer das linhas de defesa, medidas para o saneamento e mitigação de riscos devem ser adotadas, preferencialmente com o aperfeiçoamento dos controles preventivos e a capacitação dos agentes públicos.

4.2. Papel do Tribunal de Contas da União (TCU) e Tribunais de Contas Estaduais (TCEs)

Os Tribunais de Contas são órgãos de controle externo que fiscalizam a aplicação dos recursos públicos. Na fiscalização dos atos de contratação pública, o TCU e os TCEs devem adotar critérios de oportunidade, materialidade, relevância e risco, considerando as razões apresentadas pelos órgãos e entidades responsáveis e os resultados obtidos com a contratação.

Fiscalização e Aplicação de Sanções: Os Tribunais de Contas podem aplicar sanções a gestores e contratados, como multas e declaração de inidoneidade, em decorrência de irregularidades. A jurisprudência do TCU, por exemplo, serve como um guia de boas práticas e alerta para as situações que geram responsabilização.

Acesso a Informações: Os órgãos de controle devem ter acesso irrestrito a todos os documentos e informações necessários às suas atividades, inclusive aqueles classificados como sigilosos. Caso informações sigilosas sejam compartilhadas, o órgão de controle torna-se corresponsável pela manutenção do sigilo. O orçamento estimado da contratação, mesmo que sigiloso para o público, não prevalecerá para os órgãos de controle interno e externo.

Comunicação ao Ministério Público: Quando detectam ilícitos, os Tribunais de Contas têm o dever de encaminhar as informações e documentos necessários ao Ministério Público competente para a apuração.

Capacitação: A Lei nº 14.133/2021 estabelece que os Tribunais de Contas, por meio de suas escolas de contas, devem promover a capacitação de servidores e empregados públicos envolvidos na execução da Lei.

4.3. Papel da Controladoria-Geral da União (CGU) e Controladorias Estaduais/Municipais

A CGU, no âmbito federal, e as Controladorias dos Estados e Municípios (como a SCGE-PE mencionada nas fontes) atuam como órgãos centrais de controle interno e exercem um papel crucial na segunda e terceira linha de defesa.

Foco em Governança, Gestão de Riscos e Controle Preventivo: A Nova Lei de Licitações atribui um papel de destaque ao Sistema de Controle Interno, reconhecendo que a implantação da gestão de riscos e dos controles internos é essencial para obter os resultados esperados nos processos de contratação e execução contratual.

Coordenação da Gestão de Riscos: As Unidades de Controle Interno (UCIs) devem coordenar a implantação e o aprimoramento da gestão de riscos, impulsionando as áreas e agentes a gerirem seus riscos, subsidiando-os com informações relevantes e dirimindo dúvidas.

Implementação de Programas de Integridade: A CGU, por exemplo, oferece guias para a implementação de programas de integridade, que não se limitam a evitar irregularidades, mas também visam promover a conformidade com a legislação e práticas sustentáveis. A implementação de programas de integridade é inclusive uma exigência para licitantes vencedores em contratações de grande vulto e um critério para dosimetria de sanções e reabilitação.

Assessoramento Jurídico e Controle Prévio de Legalidade: Órgãos de assessoramento jurídico realizam controle prévio de legalidade em processos licitatórios e contratações diretas, analisando a viabilidade jurídica do ato proposto e indicando alternativas legais.

4.4. Controle Social e Transparência

A Lei nº 14.133/2021 fortalece a transparência e o controle social, promovendo a participação da sociedade na fiscalização das contratações públicas.

Portal Nacional de Contratações Públicas (PNCP): Instituído como o sítio eletrônico oficial para a divulgação centralizada e obrigatória de todos os atos exigidos pela Lei, como planos de contratação anuais, editais, contratos, atas de registro de preços, etc.. O PNCP oferece um sistema de gestão compartilhada com a sociedade, possibilitando a comunicação, acompanhamento e transparência na execução dos contratos públicos.

Canais de Denúncia: A Lei Anticorrupção (Lei nº 12.846/2013) e outros decretos reforçam a importância de canais de denúncia acessíveis e confidenciais para comunicar irregularidades, fomentando o controle social.

Perguntas Reflexivas: Como as três linhas de defesa se complementam para garantir o controle das contratações públicas? De que forma o Portal Nacional de Contratações Públicas (PNCP) contribui para o controle social e a redução da responsabilização dos gestores?

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5. Estratégias Preventivas para Gestores e Resumo Final

Para finalizar nossa aula, focaremos nas estratégias que os gestores podem e devem adotar para prevenir a responsabilização, promovendo um ambiente de compliance e boa governança.

5.1. Estratégias Preventivas e Boas Práticas (Compliance)

A prevenção é o pilar para uma gestão pública eficiente e segura. A Nova Lei de Licitações enfatiza a necessidade de práticas contínuas de gestão de riscos e controle preventivo.

Governança e Integridade: A alta administração tem a responsabilidade de institucionalizar a governança das contratações, implementando processos e estruturas, incluindo gestão de riscos e controles internos. Isso envolve a promoção de um ambiente íntegro e confiável, alinhando as contratações ao planejamento estratégico e às leis orçamentárias. A Portaria SEGES/ME nº 8.678/2021 detalha instrumentos e diretrizes para a governança nas contratações públicas, como Plano de Logística Sustentável, Plano de Contratações Anual, gestão por competências e gestão de riscos.

Gestão por Competências e Capacitação de Agentes:

    ◦ Designação Qualificada: É crucial designar agentes públicos para funções essenciais com base em requisitos claros: preferencialmente servidores efetivos ou empregados públicos, com atribuições relacionadas a licitações e contratos ou qualificação atestada por certificação de escola de governo, e sem conflitos de interesse. A autoridade máxima é responsável por promover essa gestão por competências.

    ◦ Capacitação Contínua: A Lei prevê que as necessidades de capacitação de fiscais e gestores de contrato sejam consideradas no estudo técnico preliminar. A capacitação é uma medida para reduzir o risco de impropriedades. Órgãos como a Escola Nacional de Administração Pública (ENAP) e as escolas de contas dos Tribunais de Contas oferecem trilhas de aprendizagem e cursos.

    ◦ Matriz de Competências: Uma ferramenta fundamental para mapear, organizar e analisar as competências necessárias para cargos e funções, auxiliando na identificação de lacunas e orientando treinamentos. Ela proporciona clareza de funções, transparência, capacitação contínua, responsabilização e eficiência processual.

Gestão de Riscos e Matriz de Riscos:

    ◦ Análise de Riscos na Fase Preparatória: A análise dos riscos que podem comprometer o sucesso da licitação e a boa execução contratual é um dos artefatos obrigatórios da fase preparatória. O propósito é compreender a natureza do risco, considerar incertezas, consequências e probabilidades, e definir tratamentos e controles preventivos.

    ◦ Matriz de Alocação de Riscos: Em contratações de grande vulto ou nos regimes de contratação integrada e semi-integrada, o edital deve obrigatoriamente contemplar uma matriz de alocação de riscos, definindo as responsabilidades entre contratante e contratado. Recomenda-se a elaboração da matriz de riscos antes da pesquisa de preços.

    ◦ Monitoramento Contínuo: Gestores e fiscais de contrato devem coordenar a atualização contínua do relatório de riscos durante toda a gestão contratual.

Registro e Documentação:

    ◦ Transparência e Rastreabilidade: A elaboração detalhada e a divulgação de documentos como o Documento de Formalização de Demanda (DFD), Estudo Técnico Preliminar (ETP), Termo de Referência (TR) e Edital são essenciais. O registro formal de todas as etapas e decisões é crucial para comprovar a legalidade e a motivação dos atos.

    ◦ Pareceres e Análises: A observância e o registro de pareceres jurídicos e de controle interno são fundamentais para a segurança jurídica do gestor. A advocacia pública poderá promover a representação do agente público se este tiver atuado em estrita observância de parecer jurídico, salvo em casos de ilícitos dolosos.

    ◦ Comunicação Interna: A documentação formal de alertas e comunicações internas entre os setores (ex: entre prefeito e secretário, ou controlador e gestor) é vital para evitar a responsabilização solidária por omissão.

Perguntas Reflexivas: Como a gestão por competências pode reduzir os riscos de responsabilização em um órgão público, e qual o papel da certificação profissional nesse processo? Qual a importância do registro formal de todas as etapas e decisões no processo de contratação para a proteção do gestor público?

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Resumo da Aula

Esta aula "Responsabilidade dos Gestores Públicos nas Contratações – Parte 2: Aplicações Práticas e Consequências" aprofundou a compreensão sobre as implicações da atuação dos agentes públicos no cenário das licitações e contratos administrativos, à luz da Lei nº 14.133/2021.

Aprendemos que a responsabilização pode se dar nas esferas administrativa, civil e penal, cada uma com suas particularidades e sanções. Vimos exemplos práticos de situações que podem levar à responsabilização, como a tomada de decisões baseadas em pareceres técnicos equivocados sem a devida diligência, a omissão na fiscalização contratual, a designação inadequada de agentes e a realização de contratações diretas indevidas.

Detalhamos as consequências administrativas, que incluem advertência, multa, impedimento de licitar e contratar e declaração de inidoneidade, além do Processo Administrativo Disciplinar para servidores. Na esfera civil, destacamos o dever de indenizar o erário e as implicações das Ações de Improbidade Administrativa.

Um ponto crucial abordado foi a tipificação dos crimes em licitações e contratos no Código Penal, com a introdução de novos artigos (como 337-F, 337-I e 337-O), que preveem penas de detenção e reclusão para condutas ilícitas, como a contratação direta ilegal, a fraude licitatória e a omissão grave de informações por projetistas.

Exploramos a atuação dos órgãos de controle, como o Tribunal de Contas da União (TCU), a Controladoria-Geral da União (CGU) e as controladorias internas, que operam sob o modelo das Três Linhas de Defesa, fiscalizando, orientando e aplicando sanções. O papel da transparência, com o Portal Nacional de Contratações Públicas (PNCP), e do controle social foi ressaltado como mecanismo essencial para a integridade.

Por fim, consolidamos as estratégias preventivas para gestores públicos, que incluem a implementação de uma sólida governança e cultura de integridade, a gestão por competências e a capacitação contínua dos agentes, a adoção rigorosa da gestão e matriz de riscos em todas as fases da contratação, e a manutenção de registros e documentação formal de todos os atos e decisões, incluindo pareceres e comunicações internas. Essas medidas são fundamentais para mitigar riscos, promover a eficiência e garantir a segurança jurídica dos gestores.

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Referências Bibliográficas

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BRASIL. Ministério da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos. Secretaria de Gestão e Inovação. Manual de Orientações e Boas Práticas na Nova Lei de Licitações e Contratos Administrativos. Brasília, DF: Ministério da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos, 2024. Disponível em: https://www.gov.br/gestao/pt-br/assuntos/compras/manuais-e-publicacoes/manual-de-orientacoes-e-boas-praticas-na-nova-lei-de-licitacoes-e-contratos-administrativos-lei-14.133-2021.pdf. Acesso em: 20 mai. 2024.

PERNAMBUCO. Secretaria da Controladoria Geral do Estado (SCGE-PE). O papel da unidade de controle interno nas contratações públicas. Recife, PE: SCGE-PE, [s.d.]. Apresentação. Disponível em: https://www.scge.pe.gov.br/wp-content/uploads/2023/10/APRESENTACAO-SCI-SCGE-NOVA-LEI-DE-LICITACOES-E-CONTRATOS-ADMINISTRATIVOS-14.133-2021-SITE-OFICIAL-03-DE-OUTUBRO-DE-2023-ok-com-conteudo-novo-2-1.pdf. Acesso em: 20 mai. 2024.

ZÊNITE. PARECER TÉCNICO – RESPONSABILIDADE DO PARECERISTA E DO GESTOR. Orientação Prática – 52/287/JAN/2018. Disponível em: https://zenite.blog.br/wp-content/uploads/2018/01/52_287_JAN_2018_Responsabilidade_do_Parecerista_e_do_Gestor_Zenite_Orientacao.pdf. Acesso em: 20 mai. 2024.

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