Alterações contratuais: prorrogações, acréscimos, supressões e revisões de valores - Parte 2

Alterações Contratuais: Acréscimos
A gestão e fiscalização de contratos administrativos, no contexto da Nova Lei de Licitações e Contratos (Lei nº 14.133/2021), exige dos gestores públicos a capacidade de lidar com a dinâmica da execução contratual, que frequentemente exige ajustes e modificações no objeto originalmente pactuado. O tema dos acréscimos contratuais é fundamental nesse contexto, pois envolve a preservação do equilíbrio econômico-financeiro e a legalidade no uso dos recursos públicos.
O que são Acréscimos Contratuais e Sua Base Legal
As alterações contratuais são modificações introduzidas nas cláusulas e condições de um contrato administrativo. Os acréscimos contratuais referem-se especificamente ao aumento do objeto do contrato, seja em quantidade, seja em complexidade, resultando na alteração do valor contratual.
A base legal para a alteração unilateral dos contratos pela Administração Pública está prevista no Art. 124, inciso I, da Lei nº 14.133/2021. Embora a legislação mencione os acréscimos no Art. 125 (referido em sua consulta), a Lei nº 14.133/2021 estabelece que a Administração pode alterar unilateralmente o contrato:
1. Quando houver alteração do projeto ou das especificações, procederemos à melhor adequação técnica aos seus objetivos (alteração qualitativa).
2. Quando for necessária a alteração do valor contratual em deficiência de acréscimo ou excesso de quantidade de seu objeto, respeitando os limites legais.
Diferenciação entre Acréscimos Quantitativos e Qualitativos
A Lei nº 14.133/2021 diferencia dois tipos principais de alterações que podem resultar em acréscimos ao contrato:
• Acréscimos Quantitativos: Correção quando há uma alteração do valor contratual em razão do aumento da quantidade do objeto, como a necessidade de adquirir mais unidades de um bem ou executar uma quantidade maior de serviço.
• Acréscimos Qualitativos: Consulte a alteração do projeto ou das especificações para que o contrato seja feito de maneira mais eficaz os objetivos técnicos da Administração. Essas mudanças mudam a essência ou a natureza técnica do objeto, mas não a sua finalidade principal.
Ambos os tipos de alteração, quando implicam aumento de encargos para o contratado, devem ser acompanhados do restabelecimento do equilíbrio econômico-financeiro inicial do contrato, o que deve ser feito no mesmo termo aditivo.
Limites Legais de Alteração
A legislação estabelece limites máximos para a realização de acréscimos unilaterais, com o objetivo de proteger a competitividade da licitação original. O contratado é obrigado a aceitar acréscimos ou supressões nas mesmas condições contratuais, observados os seguintes limites:
• Até 25% do valor inicial atualizado do contrato. Este é o limite geral aplicável a acréscimos em contratos de obras, serviços ou compras.
• Até 50% do valor inicial atualizado do contrato. Este limite é aplicável exclusivamente para acréscimos decorrentes de reformas de edifícios ou equipamentos.
É importante notar que, para supressões (diminuições unilaterais), o limite máximo é de 25% em qualquer caso. Alterações (acréscimos ou supressões) que ultrapassem esses limites somente podem ser realizadas mediante acordo contratual (consensual), desde que não desfigurem o objeto da contratação.
Requisitos Formais: Justificativa Técnica e Financeira, Registro e Termo Aditivo
As alterações contratuais, especialmente as que resultem em acréscimos de valor, excluem formalidades rigorosas para garantir a legalidade e a transparência.
1. Justificativa Técnica e Financeira: Toda alteração contratual deve ser realizada com as obrigações justificativas. A alteração deve ser formalizada com base em uma justificativa técnica e econômica. A proposta de alteração deve ser encaminhada pelo requisitante com as justificativas e prova pelo gestor do contrato, que, após a sua manifestação, será submetida à autoridade competente para deliberação.
2. Registro Formal (Termo Aditivo): As alterações contratuais significativas, como os acréscimos de valor, devem ser formalizadas por meio do termo aditivo. O termo aditivo é o instrumento formal que registra modificações contratuais importantes, como ajustes de valor ou alterações no objeto, sempre respeitando as condições e limites previstos na legislação.
3. Execução e Prazo: A formalização do termo aditivo é uma condição indispensável para que o contratado execute as prestações adicionais determinadas pela Administração. Em casos de necessidade justificada de antecipação dos efeitos, a formalização deverá ocorrer em até um mês. Além disso, a alteração não pode modificar a essência do contrato, de forma a prejudicar as condições iniciais acordadas.
Se o contrato não tiver preços unitários definidos para as obras ou serviços que exijam o aditamento, os novos preços deverão ser definidos por meio da aplicação da relação geral entre os valores da proposta original e o orçamento-base da Administração, utilizando-se os preços referenciais ou de mercado vigentes nos dados do aditamento.
Boas Práticas para Evitar Distorções e Superfaturamentos e Jurisprudência do TCU
A Administração Pública tem o objetivo legal de evitar contratações com sobrepreço, preços inexequíveis ou superfaturamento na execução dos contratos. Para isso, a Lei nº 14.133/2021 enfatiza a governança e a gestão de riscos, que são práticas cruciais para controlar os acréscimos e evitar distorções.
Boas Práticas e Controle:
• Governança e Controles Internos: A alta administração é responsável pela governança das contratações e deve implementar processos e estruturas de gestão de riscos e controles internos para monitorar os contratos e garantir que os objetivos sejam alcançados, promovendo a eficiência e a eficácia.
• Fiscalização Contínua e Integridade: As alterações contratuais devem ser acompanhadas de perto para evitar desequilíbrios, desvios de finalidade ou favorecimento indevido ao contratado. O acompanhamento e a fiscalização contínua do cumprimento das cláusulas e das alterações realizadas são responsabilidades das entidades de gestão.
• Gestão de Riscos: A matriz de riscos é uma cláusula contratual que define os riscos e responsabilidades entre as partes, sendo obrigatória em contratos de grande vulto ou nos regimes de contratação integrada e semi-integrada. Essa matriz deve definir a responsabilidade por riscos de alterações no projeto ou orçamento. A repartição de riscos deve ser fundamentada em razões técnicas e econômicas, e não ser arbitrária, para garantir uma alocação eficiente dos riscos. A alocação arbitrária pode levar à elevação dos preços das propostas e dos aditivos contratuais irregulares após a licitação.
Jurisprudência e Orientações do TCU:
A comissão do Tribunal de Contas da União (TCU) reforça a importância do planejamento detalhado para evitar aditivos que decorram de falhas no projeto inicial.
• Contratos Integrados/Semi-integrados e Responsabilidade: O TCU tem previsto que, em regimes como a contratação integrada, o contratado deve assumir encargos decorrentes de erros, incompletudes ou omissões do anteprojeto identificados durante a elaboração dos projetos básicos e executivos, se o edital não tiver previsto objetivamente a alocação desses riscos. Omissões ou indefinições no anteprojeto não justificam termos aditivos.
• A Importância da Matriz de Riscos (TCU): O TCU considera necessária a inclusão de uma matriz de risco detalhada no instrumento convocatório para contratações integradas, alocando a cada signatário os riscos inerentes ao empreendimento. Isso impede que riscos previsíveis se transformem em acréscimos onerosos não previstos na proposta original.
Conclusão Reflexiva: Controle e Previsibilidade Orçamentária
O manejo de acréscimos contratuais sob a Lei nº 14.133/2021 reflete a tensão entre a necessidade para o controle do gasto público e a flexibilidade conveniente pela realidade da execução dos contratos. A possibilidade de alterações, embora essencial, acarreta o risco de desvirtuar a isonomia obtida no processo licitatório original, especialmente se não for devidamente controlado.
A chave para uma gestão de acréscimos eficazes reside no controle e na previsibilidade orçamentária. A governança das contratações, por meio da gestão de riscos e da implementação de controles internos, atua como uma barreira contra o superfaturamento e a má gestão. É crucial que o planejamento (fase anterior ao contrato) seja robusto, minimizando a necessidade de acréscimos por falhas de projeto.
Do ponto de vista orçamentário, a lei exige que, na contratação, verifique a disponibilidade de créditos orçamentários. A Administração tem a faculdade de extinguir o contrato sem ônus quando não dispuser de créditos orçamentários para sua continuidade. Portanto, todo acréscimo deve ser acompanhado da comprovação de que há dotação orçamentária disponível, garantindo que as modificações não comprometam a saúde financeira do órgão ou entidade contratante, mantendo o alinhamento com as leis orçamentárias e o interesse público.
A correta aplicação dos limites e a formalização via termo aditivo, baseada em justificativas sólidas e transparentes , garante que os acréscimos sirvam ao interesse público, e não como instrumento de favorecimento indevido.
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REFERÊNCIAS
BRASIL. Lei nº 14.133, de 1º de abril de 2021. Lei de Licitações e Contratos Administrativos. Brasília, DF: Presidência da República, .
BRASIL. Lei nº 8.666, de 21 de junho de 1993. Regulamenta o art. 37, inciso XXI, da Constituição Federal, institui normas para licitações e contratos da Administração Pública e dá outras exceções. Brasília, DF: Presidência da República, .
ESCOLA DE SERVIÇO PÚBLICO DO ESPÍRITO SANTO (ESESP). Gestão e Fiscalização Contratual na Lei nº 14.133/21. 2024.
SILVEIRA, Elaine Dias; CARACAS, Sâmille Keise Cordeiro. A Lei de Licitações N° 14.133/21 e os Desafios dos Municípios de Pequeno Porte. Revista do Curso de Direito da Unimontes , Montes Claros/MG, v. 1, jan.-jun./2024 (Eletrônica).
TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO (TCU). Acórdão 544/2021 – Plenário.
TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO (TCU). Acórdão 2903/2016 – Plenário.
TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO (TCU). Acórdão 2980/2015 – Plenário.
TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO (TCU). Licitações e Contratos: Orientações e Jurisprudência do TCU. Brasília, DF: TCU, . (Manual atualizado em 29/08/2024).


